quinta-feira, 1 de setembro de 2011
Uma Festa de Classe!
Mais uma edição da Festa do "Avante!" está prestes a começar. Amanhã, pontualmente às 19 horas, depois de muitas semanas/meses de trabalho militante, terá lugar o comício de abertura da festa anual dos comunistas portugueses. Há muito se sabe - sabe quem quer, sabe quem a visita e partilha, sabe quem olha a Festa sem preconceitos anticomunistas - que a Festa do "Avante!" é a maior realização político-cultural de massas que se realiza em Portugal, todos os anos se renovando como espaço de alegria e fraternidade, aberto à fruição por multidões de jovens e menos jovens, nos seus espectáculos, nas suas exposições, nas suas mostras culturais - este ano temos a XVII Bienal de Artes Plásticas - nos seus espaços gastronómicos, nos seus debates políticos.
A Festa é isto e muito mais, todos os anos surpreendendo os nossos amigos e também os nossos inimigos, por uma fundamental razão: é uma festa de classe. Isto mesmo fica bem atestado na parte do editorial do jornal "Avante!" que hoje saiu:
"As 6300 participações nas jornadas de trabalho – o número mais elevado dos últimos anos – são bem a demonstração da disponibilidade dos comunistas para a necessária luta que temos à nossa frente.
A confirmar que o Partido que constrói esta Festa que mais ninguém consegue construir é um partido necessário, indispensável e insubstituível.
Esta Festa feita à nossa maneira comunista, com esta participação militante, dedicada, em que cada um, porque participa na sua edificação, a sente como sua, como nossa – e transmite esse sentir aos milhares de visitantes que por lá passarão durante os três dias da sua duração – é bem a demonstração da sociedade que um dia construiremos.
Na realidade, numa situação como a que vivemos – em que as classes dominantes, através de uma poderosa ofensiva desenvolvem a ideologia das inevitabilidades, da resignação, da passividade, do conformismo, do não-vale-a-pena – a construção da Festa do Avante!, nos moldes em que se concretiza, constitui uma resposta frontal a essa ideologia, derrotando-a aqui e agora, numa batalha ganha com o empenhamento, a determinação, a convicção e a certeza, nascidas da consciência revolucionária.
Amanhã lá estaremos, nós, militantes comunistas; mais os que, não sendo filiados no Partido, estão connosco nas lutas de todos os dias."
Palavras certeiras, palavras justas, na avaliação desta característica fundamental da Festa do "Avante!" que a distingue de todos os outros eventos políticos e que explica porque razão todos os outros partidos políticos, sendo todos partidos do grande capital e ao seu serviço, jamais conseguiram ou conseguirão realizar um evento com tal dimensão e grandeza política: esta é uma festa dos trabalhadores. Construída e realizada por trabalhadores - operários, empregados, intelectuais, artistas - e que lhe imprimem uma diferenciadora e indelével marca de classe, marca de classe que a todos eles lhes permite, legítima e orgulhosamente, chamarem-lhe a sua Festa.
Vêm aí três dias carregados de são convívio, de confiança na luta, de futuro. Vamos à Festa!
sexta-feira, 26 de agosto de 2011
Meios de "informação" criminosos
Na cobertura da situação existente em vários países árabes - nomeadamente a Líbia e a Síria -, marcada por uma violenta guerra de contra-informação, poucos são os jornalistas que relatam com isenção a realidade, sendo-lhes necessárias muita determinação e muita coragem para o fazerem. É o caso do autor deste despacho, escrito a partir de Tripoli e já ameaçado de morte, tal como o seu camarada Mahdi Darius Nazemroaya, por "colegas" estadunidenses com os quais partilhava o Hotel Rixos, infestado dos chamados "jornalistas embedded", alguns dos quais elementos da CIA e de outros serviços de inteligência dos países agressores.
Lá como cá, seja na fabricação de climas adequados à dócil aceitação das "verdades" difundidas pelos imperialistas, seja na mistificação e manipulação das situações nacionais internas, os pequenos "goebbels" que pululam as redacções dos grandes meios mediáticos são isto mesmo: criminosos, justamente merecedores de uma firme condenação, hoje política e amanhã criminal, como réus de crimes nojentos de lesa-povos, cometidos diariamente contra as mentes e as consciências dos seus concidadãos mais desprotegidos.
"A propaganda de guerra entrou em nova fase, e hoje envolve a acção coordenada de estações de TV por satélite. CNN, France24, a BBC e a rede al-Jazeera converteram-se em instrumentos de desinformação, usadas para demonizar governos e governantes e justificar agressões armadas.
Essas práticas são crimes tipificados na legislação internacional. É preciso pôr fim à impunidade desses criminosos ‘midiáticos’. A informação processada e distribuída sobre a Líbia e a Síria marca um ponto de virada na história da propaganda de guerra, e os meios usados tomaram de surpresa a opinião pública internacional.
Quatro potências – EUA, França, Reino Unido e Qatar – somaram os seus meios técnicos para intoxicar a ‘comunidade internacional’. Os principais canais usados foram a CNN (embora privada, interage com a unidade de guerra psicológica do Pentágono), France24, a BBC e a rede al-Jazeera.
Esses veículos estão sendo usados para atribuir aos governos da Líbia e da Síria crimes que não cometeram, ao mesmo tempo que trabalham para encobrir os crimes que estão sendo cometidos pelos serviços secretos daquelas potências bélicas e pela OTAN.
Assistimos a golpe similar, em menor escala, em 2002, quando os canais Globovisión distribuíram imagens do que seria (mas não era) uma revolta popular contra o presidente eleito Hugo Chávez e imagens de activistas armados, identificados pela Globovisión como se fossem activistas chavistas, atirando contra manifestantes.
Essa encenação tornou-se necessária para mascarar um golpe militar orquestrado por Washington, com a colaboração de Madrid.
Em seguida, depois que o levantamento popular legítimo fez abortar o golpe e reintegrou o presidente eleito, investigações conduzidas pela justiça venezuelana e por jornalistas sérios revelaram que a ‘revolução’ filmada e distribuída pelo canal Globovisión não passava de simulacro, criado por artifícios técnicos, e que nenhum chavista jamais atirara contra manifestantes; e que, isso sim, os manifestantes haviam sido vítimas de atiradores mercenários ao serviço da CIA.
Vê-se acontecer o mesmo, novamente, agora, mas os criminosos são canais de televisão consorciados que distribuem imagens de eventos inexistentes na Líbia e na Síria. O objetivo é fazer crer que a maioria dos líbios e dos sírios desejariam a destruição de suas instituições políticas e que Muammar Gaddafi e Bashar al-Assad teriam massacrado os seus próprios povos. A partir dessa intoxicação ‘midiática’, a OTAN atacou a Líbia e está em vias de também destruir a Síria.
Facto é que, depois da 2ª Guerra Mundial, a Assembléia Geral das Nações Unidas aprovou legislação específica que proíbe e pune essas práticas ‘midiáticas’.
A Resolução n. 110, de 3/11/1947 criou “procedimentos a serem adotados contra a propaganda e incitadores de nova guerra”, condena “propaganda construída explicita ou implicitamente para provocar ou encorajar qualquer tipo de ameaça à paz, quebra de paz negociada ou acto de agressão."
A Resolução n. 381 de 17/11/1950 reforça aquela condenação e condena explicitamente qualquer censura à informação, como parte da propaganda contra a paz. Finalmente, a Resolução n. 819 de 11/12/1954 sobre “remoção de barreiras que impeçam a livre troca de informação e idéias” reconhece a responsabilidade dos governantes no acto de remover barreiras que impeçam a livre troca de informação e idéias.
Ao fazê-lo, a Assembléia Geral desenvolveu doutrina própria sobre a liberdade de expressão: condenou todas as mentiras que levam à guerra; e impôs o livre fluxo de informações e idéias e o debate crítico, como armas a serem usadas necessariamente a favor da paz. Palavras e, sobretudo, imagens, podem ser manipuladas de modo a servirem como ‘justificativa’ para os piores crimes.
Nesse sentido, a intoxicação da opinião pública provocada pelas falsas notícias distribuídas por CNN, France24, BBC e al-Jazeera pode ser definida como prática de “crime contra a paz”.
Essas práticas criminosas ‘midiáticas’ devem ser vistas como mais sérias do que outros crimes de guerra e crimes contra a humanidade cometidos pela OTAN na Líbia e por agências ocidentais de inteligência na Síria, na medida em que os crimes ‘midiáticos’ precederam e possibilitaram a prática dos demais crimes.
Todos os jornais, redes de televisão públicas e privadas e todos os jornalistas que operaram na propaganda de guerra – a favor dos ataques militares contra a Líbia (e, deve-se prever, em breve também contra a Síria) – devem ser julgados pela Corte Internacional de Justiça."
Thierry Meyssan, "Mathaba"
(Publicado no blog "Lótus Egípcio")
sábado, 13 de agosto de 2011
O Capitalismo, imparável, agoniza
Três anos depois, a crise aprofundou-se, ganhou novos contornos auto-destrutivos, liquidou panaceias e tímidas tentativas de a controlar e investe com toda a brutalidade contra os trabalhadores e os povos, em todos os continentes. Traço novo da actualidade da crise sistémica do capitalismo é o facto de estar hoje a fustigar não já só os países periféricos e menos desenvolvidos mas os que constituem o centro nevrálgico e mais desenvolvido do capital globalizado: os EUA, a U.Europeia, o Japão, irradiando já os seus efeitos letais sobre os "milagrosos" países de reserva estratégica, os chamados "BRICS", até há pouco considerados como possíveis novas "locomotivas" desenvolvimentistas que iriam assegurar, nesta situação de regressão económica do centro, a reprodução do capital.
Se nos planos económico e financeiro/cambial as notícias são aterradoras para os defensores do capitalismo, a esse quadro objectivo soma-se nestes últimos meses e semanas um outro elemento de caracterização da actualidade muito importante: por todo o mundo, praticamente, eclodem revoltas populares, insurreições, movimentos de contestação do sistema capitalista, novas manifestações de protestos e insubmissões populares, tudo configurando um quadro de resistência e de contestação ao "status quo" dificilmente imaginável há pouco tempo atrás para os analistas e comentadores que, ao serviço dos governos e poderes de turno, desempenham o sujo papel da manipulação ideológica da realidade. Primeiro as revoltas e insurreições populares nos países árabes, depois as grandes manifestações e ocupações insurgentes de ruas e praças em numerosas capitais "ocidentais", a par de vigorosas lutas travadas por diversos movimentos operários nacionais, defrontando as forças repressivas e impondo-lhes grandes recuos e derrotas, com novas expressões da luta de classes, com contornos contestatários novos (são ex. os recentes levantamentos populares em estados norte-americanos) e com a vinda às ruas e à luta de populações que ainda há pouco se poderia pensar estarem "pacificadas", submetidas, recuadas (ex., as grandes manifestações em Telavive - 300.000! -, que ainda decorrem). Nas camadas juvenis, nas gerações mais jovens de assalariados precários e sem direitos, crescem as demonstrações de resistência e de maior disponibilidade para o combate social e para lutas de conteúdo político e de rejeição do sistema dominante.
O mundo muda vertiginosamente, num tempo histórico que parece acompanhar os fenómenos da relatividade descritos por Einstein, "encurtando" os espaços e os tempos. Vencendo as barreiras da desinformação e da intoxicação dos grandes "média" globalizantes, os trabalhadores e os povos sentem-se mais próximos, mais irmanados por uma comum e crescente repulsa pelo actual estado de coisas que ainda vigora no mundo capitalista e, vão unificando paulatinamente energias e vontades de mudança, fazendo crescer a confiança nas suas próprias forças, acreditando mais, a cada dia que passa, a cada luta travada, não importa em que canto distante do globo, que "sim, é possível", lutar e enfim conquistar novos avanços no combate por um mundo novo e melhor. A cada dia que passa, o poder dos banqueiros e dos monopólios perde apoios e antigos simpatizantes e ganha novos adversários, novos opositores.
O capitalismo, como sistema mundial, imparável na sua marcha destruidora e anti-humana, de facto agoniza, entrou definitivamente no seu último trajecto vital. Mergulhado em crise profunda e galopante, roído pelas suas próprias e insanáveis contradições,confrontando-se com a óbvia incapacidade de se auto-reformar, recorrendo de forma crescente à guerra imperialista e de extermínio de povos e países inteiros, defrontando uma resistência crescente das massas trabalhadoras e populares, o sistema capitalista já entrou no período final da sua etapa senil. Brutal, desumano, caminha aceleradamente para o seu fim, neste século XXI que sem dúvida testemunhará o seu afundamento e desaparecimento.
Se os dados da realidade contemporânea nos sustentam esta nova visão sobre um capitalismo agonizante, tal não significa que ele aceite o suicídio. Resistirá à morte que se avizinha, debater-se-á contra as suas próprias mazelas mortais, originará ainda incontáveis crimes e sacrifícios - humanos, sociais, ambientais, civilizacionais - mas desaparecerá nos anos ainda das vidas de muitos de nós. Entretanto, esse processo transformador não terá geração espontânea, não resultará de um gradual transição do velho para o novo, qual crisálida miraculosa. A destruição deste sistema explorador será tarefa dos explorados, dos povos em luta contra a sua etapa imperialista terminal. E isto deve constituir a prioridade central da existência e da actividade dos partidos operários e revolucionários.
Neste espaço já anteriormente se escreveu sobre as perplexidades e os atrasos que se evidenciaram na generalidade dos partidos que se afirmam operários e marxistas-leninistas, quando a maior e mais grave crise do capitalismo eclodiu há três anos atrás, apontando-se nessa altura algumas das possíveis razões para esses atrasos e incapacidades. Tais razões, hoje, pouco nos podem já ajudar a sustentar uma análise rigorosa da actualidade nesta segunda metade de 2011. E, sobretudo, é a realidade actual, na sua dialéctica, que nos "empurra" para uma nova avaliação e um novo rumo a darmos ao combate de classes. Em finais de 2008, foi doloroso e gerou estupefacção ouvir dirigentes comunistas aceitarem como necessário a injecção de grandes somas dos recursos públicos na banca, alegadamente justificada pela necessidade de garantir a liquidez dos bancos(!). Hoje, tais erros são absolutamente imperdoáveis. Não mais é possível justificar tais posições oportunistas com o carácter surpreendente e desconhecido da nova situação criada pelo capital. Estamos obrigados - sempre - a avaliarmos de forma séria e autocrítica os erros que cometemos, aprendendo com a experiência a não mais voltar a cometê-los.
Nesta nova realidade, em mutação histórica acelerada, os revolucionários têm o indeclinável dever, perante os trabalhadores e os povos, de erguer corajosamente a bandeira do Socialismo, apontando o caminho da insubmissão e da luta revolucionária à classe operária e a todos os explorados, mostrando e demonstrando-lhes que não existe qualquer outro caminho, não existem terceiras vias ou percursos alternativos, escapatórias. Para as forças revolucionárias esse caminho, único, sólido, consequente e coerente, será sem dúvida muito áspero, muito exigente. Ser-nos-ão necessários muita determinação, muita coragem política, muita moral revolucionária para o percorrer sem hesitações ou tibiezas acomodatícias. Mas, em alternativa, trair este caminho equivalerá a cair no pântano do oportunismo, da conciliação de classes, da traição aos interesses e tarefa histórica do proletariado, tornando os partidos operários em partes integrantes do sistema de opressão e exploração dos trabalhadores e dos povos.
"Pequeno grupo compacto, seguimos por uma estrada escarpada e difícil, segurando-nos fortemente pela mão. De todos os lados, estamos cercados de inimigos, e é preciso marchar quase constantemente debaixo de fogo. Estamos unidos por uma decisão livremente tomada, precisamente a fim de combater o inimigo e não cair no pântano ao lado, cujos habitantes desde o início nos culpam de termos formado um grupo à parte, e preferido o caminho da luta ao caminho da conciliação." (Lénine - "Que Fazer?")
segunda-feira, 25 de julho de 2011
Ode à Loucura
Como explicar que, em meio à repressão e tirania de Fulgencio Batista e seus sicários esses meninos e meninas lançaram-se para o desconhecido e arriscaram seus sonhos mais doces: a namorada, o trabalho, os amigos, a vida.
“Há loucura que fizeram o dia” ... é o que diz numa de suas canções Silvio Rodriguez e, a mim, parece lembrar o 26 de julho de 1953, quando Santiago de Cuba e Bayamo amanheceram com Sol e estilhaços.
De que outra forma, entender a ousadia daqueles jovens intrépidos - atacando os quartéis da Moncada e Carlos Manuel de Céspedes - guerreiros inexperientes de peito aberto às balas e coração transbordando de Pátria.
Como explicar que, em meio à repressão e tirania de Fulgencio Batista e seus sicários esses meninos e meninas lançaram-se para o desconhecido e arriscaram seus sonhos mais doces: a namorada, o trabalho, os amigos, a vida.
"Há loucuras de Deusas e de Deus" ... segue cantando o poeta e a mim parece que ele diz pensando em Fidel, Raúl, Almeida, Haydée e Melba, em Abel Santamaría e seus olhos bem abertos e que não param de olhar para nós, de dar luz aos cubanos e cubanas.
segunda-feira, 20 de junho de 2011
Líbia: Mais um testemunho directo - e corajoso - da barbárie imperialista.
É claramente evidente que a OTAN excedeu o seu mandato, mentiu acerca das suas intenções, é responsável por assassínios extra-judiciais, tudo em nome da “intervenção humanitária”.
No período em que integrei o Comité de Relações Internacionais no Congresso, entre 1993 e 2003, tornou-se-me evidente que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) constituía um anacronismo. Fundada em 1945, no final da II Guerra Mundial, a OTAN foi criada pelos EUA como resposta à sobrevivência da União Soviética enquanto Estado Socialista. A OTAN constituía o garante político, para os EUA, de que a dominação capitalista sobre as economias Europeia, Asiática e Africana iria prosseguir. E esta garantia assegurava também a sobrevivência do apartheid global então existente.
A OTAN é um pacto de segurança colectiva através do qual os estados membros assumem que um ataque contra qualquer deles é um ataque contra todos eles. Por conseguinte, se a União Soviética tivesse atacado um qualquer dos seus membros europeus, o escudo militar norte-americano seria activado. A resposta soviética a este pacto foi o Pacto de Varsóvia, que sustentou um “cordão sanitário” em torno do território russo central, na eventualidade de um ataque da OTAN. Dessa forma o mundo foi cindido em blocos, dando origem à “Guerra Fria”.
Os “guerreiros frios” confessos dos dias de hoje continuam a encarar o mundo dessa forma, e não conseguem ultrapassar a visão de uma China Comunista e de um Império Soviético amputado como Estados inimigos dos EUA cujas movimentações, seja em que parte do planeta se verifiquem, devem ser contrariadas. O colapso da União Soviética proporcionou uma oportunidade acelerada para que a hegemonia dos EUA fosse exercida em áreas de anterior influência russa. Territórios africanos e eurasiáticos onde se situam antigos estados soviéticos satélites, bem como o Afeganistão, o Paquistão e outros têm sempre assumido um lugar predominante nas teorias da “contenção” e do “ricochete” que até aos dias de hoje orientam a política dos EUA.
Com tudo isto como pano de fundo, o ataque de foguetões contra Tripoli na noite passada é inexplicável. Tripoli, uma área metropolitana com cerca de 2 milhões de habitantes, suportou 22 a 25 bombardeamentos ontem à noite, abalando e partindo janelas e fazendo tremer o meu hotel até aos alicerces.
Abandonei o meu quarto no Hotel Rexis Al Nasr, caminhei pelo exterior, e podia sentir o cheiro dos explosivos. Por toda a parte, habitantes locais de mistura com jornalistas estrangeiros de todo o mundo. Enquanto ali estávamos, mais bombas atingiram vários pontos da cidade. As explosões clareavam o céu de vermelho, e mais foguetões disparados por jactos OTAN atravessavam as nuvens baixas antes de explodir.
Podia sentir na boca a poeira espessa levantada pelas bombas. Pensei de imediato nas munições de urânio empobrecido que se diz estarem a ser utilizadas, bem como as de fósforo branco. Se estão a ser utilizadas armas de urânio empobrecido, de que forma afectarão os civis locais?
Mulheres transportando crianças pequenas fugiam para fora do hotel. Outras corriam a lavar a poeira que lhes entrara para os olhos. Com as sereias rugindo, viaturas de emergência surgiram na zona sob ataque. Os alarmes dos carros, disparados pelos impactos sucessivos, podiam ouvir-se sob os cânticos desafiadores do povo.
Tiros esporádicos de armas de fogo romperam, ao que me pareceu em todo o lado à minha volta. A estação Euronews mostrou imagens de enfermeiras e médicos entoando cânticos, nos próprios hospitais em que tratavam aqueles que a última investida de choque e assombro da NATO deixara feridos. De repente, as ruas à volta do meu hotel encheram-se de gente a cantar e de automóveis a buzinar. Dentro do hotel, uma mulher líbia transportando uma criança aproximou-se de mim e perguntou-me por que lhes estão a fazer isto?
Quaisquer que fossem os objectivos militares do ataque (e eu e muitos outros questionamos a utilidade militar de semelhantes ataques) permanece o facto de que este ataque aéreo foi lançado contra uma grande cidade repleta de centenas de milhares de civis.
Reflecti também se algum dos políticos que autorizou este ataque aéreo alguma vez se encontrou do lado errado de munições de urânio empobrecido guiadas a laser. Teriam alguma vez presenciado os danos horríveis que estas armas provocam numa cidade e nos seus habitantes? Pode suceder que, se alguma vez tivessem estado numa cidade sob ataque aéreo, se tivessem sentido o impacto destas bombas, se tivessem visto a devastação causada não estivessem tão dispostos a autorizar um ataque contra a população civil.
Estou convicta de que a OTAN não teria sido tão negligente com a vida humana se tivesse sido convocada para atacar uma cidade importante do ocidente. Aliás, estou convicta de que tal nunca sucederia. A OTAN (tal como os EUA e os seus aliados) apenas ataca os pobres e os desprotegidos do 3º mundo.
No dia anterior, numa iniciativa de mulheres em Tripoli, uma mulher aproximou-se de mim de lágrimas nos olhos: a mãe está em Benghazi e ela não pode voltar para saber se a mãe está ou não bem. As pessoas do oriente e do ocidente do país viviam em comum, amavam-se, casavam entre si. Agora, em consequência da “intervenção humanitária” da OTAN, geraram-se e endurecem divisões artificiais. O recrutamento de aliados pela OTAN na Líbia oriental insere-se na mesma estratégia de “guerra fria” que procurava assassinar Fidel Castro e derrubar a Revolução Cubana com cubanos “aclimatados” dispostos a cometer actos de terrorismo contra o seu anterior país. Mais recentemente, a República Democrática do Congo foi ameaçada de amputação territorial, depois de Laurent Kabila recusar uma solicitação da Administração Clinton no sentido de abandonar a zona oriental do seu país. Laurent Kabila descreveu pessoalmente o encontro em que esta solicitação e a respectiva recusa sucederam. Este plano de balcanização e de amputação de um país africano (como sucedeu no Sudão) só não foi por diante porque à recusa de Kabila se juntou a mobilização de congoleses em todo o mundo, que se organizaram em defesa da integridade territorial do seu país.
Horrorizou-me saber que os aliados da OTAN na Líbia (os “Rebeldes”) têm linchado e massacrado os seus compatriotas de pele mais escura, depois da imprensa dos EUA ter identificado os Negros Líbios como “mercenários negros”. Digam-me agora, por favor: vão expulsar os negros de África? Informações da imprensa sugerem que os americanos ficaram “surpreendidos” por encontrar pessoas de pele escura em África. O que é que isto nos diz acerca desta gente?
O triste facto, entretanto, é que são os próprios líbios que têm sido insultados, aterrorizados, linchados, assassinados, em consequência das informações que hiper-sensacionalizaram esta grosseira ignorância. Quem é que vai ser responsabilizado pelas vidas perdidas no frenesim sanguinário desencadeado por estas mentiras?
E isto traz-me de regresso à pergunta que a mulher me colocou: porque está isto a acontecer? Honestamente, não pude dar-lhe a resposta educada e razoável que ela esperava. Do meu ponto de vista, todo o público internacional se debate com essa questão “Porquê?”.
O que sabemos e está muito claro é isto: aquilo a que eu assisti na noite passada não é uma “intervenção humanitária”.
Muitos alimentam a suspeita de que a questão é a quantidade de petróleo existente no subsolo líbio. Podem chamar-me céptica, mas dá que pensar como é que forças combinadas de terra, mar e ar da OTAN e dos EUA, custando milhares de milhões de dólares, são mobilizados contra um relativamente pequeno país do Norte de África e se supõe que todos fiquemos convencidos de que se trata de defender a democracia.
O que eu vi nas longas filas de espera para obter combustível não é “intervenção humanitária”. A recusa em autorizar fornecimento de medicamentos para os hospitais não é “intervenção humanitária”. O que é mais triste e que sou incapaz de dar uma explicação plausível do porquê às pessoas agora aterrorizadas pelas bombas da OTAN, mas é claramente evidente que a OTAN excedeu o seu mandato, mentiu acerca das suas intenções, é responsável por assassínios extra-judiciais, tudo em nome da “intervenção humanitária”.
Onde está o Congresso quando o Presidente excede as suas competências no desencadear da guerra? Onde está a “consciência do Congresso”?
Para aqueles que discordam do conselho de Dick Cheney, de que preparemos a próxima geração para a guerra, é necessário que dêem apoio a quem quer que seja que esteja disposto a pôr fim a esta loucura. Por favor organizem-se e depois votem pela paz. A gente de todo o mundo precisa de que nos levantemos e falemos, em seu nome e no nosso, porque a Venezuela e o Irão também estão sob ameaça. Os líbios não precisam dos helicópteros bombardeiros da OTAN, nem de bombas inteligentes, mísseis de cruzeiro ou bombas de urânio empobrecido para resolver os seus problemas internos. A “intervenção humanitária” da OTAN tem que ser denunciada pelo que realmente é à luz crua da verdade.
Enquanto anoitece sobre Tripoli tenho, juntamente com a população civil, de me preparar para mais “intervencionismo humanitário” da OTAN.
Parem de bombardear África e os pobres de todo o mundo!
16.Jun.2011
Cynthia McKinney*
*Antiga membro do Congresso dos EUA eleita pelo Partido Democrático, integra actualmente o Green Party, pelo qual foi candidata à eleição presidencial de 2008. Nos últimos anos dos seus mandatos, vem integrando diversos movimentos cívicos, subscrevendo várias iniciativas legislativas de frontal contestação às políticas do governo estadounidense, nomeadamente exigindo a saída das tropas do Iraque, o apuramento da verdade sobre o 11 Setembro, a divulgação dos relatórios da CIA sobre o assassinato de Martin Luther King, a denúncia das agressões imperialistas na R.P. do Congo, a exigência de apoios às vítimas em Nova Orleãs do furacão Katrina, um pedido de "impeachment" de Bush. Integrou a delegação de activistas pró-palestinianos que embarcou no "navio da dignidade" com destino a Gaza, sendo deportada para os EUA pelos sionistas e, mais recentemente, empenhou-se na luta contra a agressão militar imperialista contra o povo líbio.
quarta-feira, 15 de junho de 2011
Líbia - O país de vez na criminosa estratégia imperialista.
A situação na Líbia, alvo de ataques e bombardeamentos aéreos diários por parte dos "aliados" da NATO, exige-nos atitudes de denúncia vigorosa desta "Aliança"(?!) e acções de solidariedade com o povo líbio, actualmente o escolhido pelos imperialistas do eixo EUA/UE como o alvo de vez da sua estratégia mais geral, ao programarem guerras de agressão contra todos os países que, mesmo de forma mitigada, se vêm opondo aos seus desígnios imperiais, ao mesmo tempo que praticam autênticos assaltos à mão armada às riquezas e recursos desses países.
De novo se repetem as mesmas imagens, quando é possível vislumbrá-las nalguns canais noticiosos internacionais, com a divulgação de cenas de terror, de destruição - mesmo de hospitais, de escolas, de infra-estruturas vitais para a vida das populações agredidas -, imagens do extermínio de civis transformados, numa linguagem hipócrita, em descartáveis vítimas "colaterais".
Em seguida, transcreve-se um texto publicado no "Il Manifesto" italiano e divulgado no companheiro "Blogue do Velho Comunista", no qual se descrevem os meios militares já "gastos" pelos agressores nos ataques à Líbia, bem como a forma como os arsenais estado-unidenses continuam a alimentar os esgotados stocks europeus, assim alimentando a indústria militar da morte. São dados de mais uma das muitas guerras da Nato imperialista, nas quais a participação e conivência de Portugal nos cobre a todos de enorme vergonha. Uma criminosa participação que, em cada dia que passe, torna mais urgente a sua corajosa denúncia e a correspondente e inadiável exigência política da saída do nosso país dessa organização, uma organização militar ao serviço da agressão imperialista contra os povos em todo o mundo.
Os estoques de munições da força aérea aliada estão esgotados. Mas para continuar a destruição da Líbia, o Pentágono aprovisiona a NATO. A guerra é assim um negócio rentável.
Em 60 dias de « Protecção Unificada » os aviões da NATO efectuaram, segundo dados oficiais, mais de 9.000 missões na Líbia, entre as quais 3.500 ataques com bombas e mísseis. A maior parte é levada a cabo pela força aérea dos EUA, Grã-Bretanha, França, Itália e Canadá. Aviões italianos (Tornado, Eurofighter 2000, F-16 e outros) efectuaram, segundo uma estimativa, cerca de 900 missões. Com eles participam igualmente Suécia, Espanha, Holanda, Bélgica, Noruega, Dinamarca, Emirados Árabes Unidos, Jordânia, Qatar e Turquia.
No total, mais de 300 aviões estão envolvidos, isto porque esta guerra permite igualmente testar, em condições reais, novas armas, como o caça francês Rafale. A aeronáutica italiana está experimentando o avião Boeing KC767-A, que acabou de receber e que efectua operações de aprovisionamento em pleno voo de caças-bombardeiros e também transportes aéreos estratégicos. No seu baptismo no aeroporto de Pratica di Mare, este foi apresentado como «o pilar para uma única e excepcional capacidade de projecção da componente aérea não só a nível nacional mas também de toda a NATO». Assim, um novo sistema de armas é testado na guerra da Líbia para potencializar a capacidade da NATO na projecção de forças aéreas e terrestres noutras guerras.
A operação « Protecção Unificada » revela, no entanto, algumas deficiências. Com o incessante bombardeamento, as bombas esgotam-se. No entanto não há problema, sendo que o Pentágono continua a fornecer. O coronel Dave Lapan, porta-voz do departamento de Defesa afirmou: «Desde que a NATO tem liderado a campanha aérea, temos fornecido um apoio material, munições inclusive, aos aliados e aos parceiros participantes nas operações na Líbia». Lapan precisa que este fornecimento, cujo valor ascende agora a 24,3 milhões de dólares, inclui «bombas inteligentes teleguiadas de extrema precisão». Na Itália, estas bombas estão estocadas em enormes quantidades em Camp Darby, a base logística (estadunidense, NdT) que aprovisiona as forças aéreas dos EUA na zona mediterrânea e africana.
terça-feira, 7 de junho de 2011
Pelo seu voto, 440.863 portugueses afirmam-se dispostos à luta!
Reflexo desse (induzido) desinteresse político e elemento importante de análise aos números eleitorais reside no aumento da massa de abstencionistas e no crescimento dos votos brancos, o primeiro expresso nos 41,1% da abstenção - mais 120.000 eleitores a recusarem votar - e, o segundo, nos 2,67% de votos brancos - subindo de 99.000, em 2009, para os 148.000 votos de agora.
Entretanto, um outro dado dos resultados ainda mais importante emerge, com toda a força da sua própria dimensão: neste passado domingo, mais de 440.000 portugueses tiveram a capacidade e a determinação de recusar todas as "inevitabilidades" e de afirmar vigorosamente, com o seu voto, que querem uma decidida viragem na vida nacional, que exigem e que lutam e lutarão por um outro caminho para o nosso país e para o nosso povo. São uma força imensa, pois não obstante constituírem a minoria do eleitorado português que votou, são a parte mais esclarecida e combativa dos eleitores, são todos aqueles que, de facto, levaram a luta até ao voto! E estes são os indispensáveis e insubstituíveis.
Terminado o intenso e militante esforço que foi realizado na campanha pelos milhares de camaradas e activistas da CDU, esforço no qual - não se tenha a mais pequena dúvida! -, reside por inteiro o êxito alcançado na mobilização para o voto consequente daqueles 440.000 eleitores, é chegado de novo e sempre o tempo de prosseguir a luta. Sabemos o que pelos banqueiros e outros grandes capitalistas está sendo tramado, contra os trabalhadores e o povo, contra a independência e dignidade do nosso país. Sabemos que as próximas rábulas sobre lideranças partidárias "renovadas" se destinam a prosseguir com a cenografia das "oposições" do baile mandado - ora agora "comes" tu, ora agora "avio-me" eu -, entre os partidos do "arco institucional", aqui se incluindo um metamorfoseado BE. Entretanto, a realidade está pelos que lutam, pelos que resistem e combatem, com coragem e determinação; o desenvolvimento dialéctico do real está com todos aqueles que estão determinados a combater o desgraçado estado actual deste regime esgotado, batendo-se pelo seu fim e substituição por um regime verdadeiramente livre e democrático, inteiramente ao serviço dos trabalhadores e das outras camadas sociais anti-monopolistas suas aliadas.
O real vai aproximar muitos dos votantes PS/PSD/CDS/BE daqueles que, eleitores da CDU ou abstencionistas, sempre lutaram e continuarão lutando contra estas políticas predatórias e destrutivas do país. Sem exclusão de um único daqueles centenas de milhar (milhões, mesmo) de operários, assalariados, intelectuais e quadros técnicos, pequenos empresários, de todos aqueles que, ludibriados pela actividade ideológica dos seus verdadeiros inimigos, votaram directamente contra os seus interesses e futuro, sem terem as ferramentas de análise que lhes permitiriam avaliar e recusar as funestas consequências de uma escolha errada e as suas próprias responsabilidades na avalanche negra que aí vem. Não direccionemos nunca a nossa luta contra esse eleitorado que vota erradamente, mas sim e sempre contra os seus (e nossos) algozes, contra o inimigo comum.
Prosseguir uma denúncia vigorosa dos inimigos de classe dos trabalhadores, esclarecer e agitar, unir e mobilizar para a acção, alargar e intensificar a luta, são as prioridades do momento, são as orientações na ordem do dia. Juntos, iremos à luta - que continua!
sexta-feira, 3 de junho de 2011
Domingo, o Voto de Classe é CDU!
segunda-feira, 30 de maio de 2011
Grécia: mais um testemunho, insuspeito e em directo.
Todos aqueles que acompanhamos o desenvolvimento da situação sócio-política na Grécia vamos tendo conhecimento do brutal agravamento das condições de vida dos trabalhadores e do povo gregos, resultado directo da manobra de ocupação e espoliação selvática que neste país - nosso irmão de infortúnio - está a ser operada pela UE imperialista, de mãos dadas com os EUA.
Depois de um ano de austeridade, nós gregos vimos o nosso país e as nossas vidas ficarem irreconhecíveis.
Um ano depois de o Fundo Monetário Internacional e a União Europeia terem imposto a sua própria agenda infame à Grécia, a vida aqui mudou radicalmente. Quem tem entre 18 e 24 anos de idade, o mais certo é estar desempregado como 40% da sua geração. Quem tem trinta e poucos anos e um emprego, é provável que seja em tempo parcial e flexível. É possível que não o imagine estável e não faz ideia do tempo que irá durar. Os salários caiem gradualmente, não se pode fazer greve, não podemos organizar de forma coletiva e nem sequer exigir que nos paguem. As férias estão fora de questão, adoecer é um risco demasiado grande e não é possível ter casa própria.
Os jovens gregos não podem fazer escolhas normais na vida: não podem planejar o presente, quanto mais o futuro. Mas dizem-lhes – e muitos sentem-no - que não se podem queixar. Afinal pertencem a uma geração condenada.
A maior parte dos gregos deixou de ver as notícias ou de pensar sobre a razão de isto estar acontecendo. Mas toda a gente fala entre si sobre o que se está se passando: amigos, filhos e pais, comerciantes, taxistas, professores - todos dizem que esta austeridade é desleal e injusta, mas também todos se sentem inseguros e receosos: ao fim e ao cabo não há nada que possam fazer. Esta nova realidade parece ter sido lançada sobre nós - quase como um fenómeno sobrenatural. Dizem-nos que arcamos com as culpas da crise porque "todos nós andamos na vadiagem e gastamos para além das nossas possibilidades" - mas os que sofrem mais sabem que não tiveram nada a ver com isto.
Ainda não se passaram 12 meses desde que esta crise começou, mas as pequenas histórias que ilustram a mudança estão sempre aparecendo: sem-abrigo a vasculhar os caixotes do lixo à procura de comida, amigos despedidos sem indemnização ou aceitando cortes salariais, a polícia reprimindo cidadãos em protesto, escolas e hospitais que fecham, professores e médicos que perdem o emprego, jornalistas censurados, sindicalistas perseguidos, ataques racistas no centro da cidade. Legalidade, maioria, democracia e igualdade começam a parecer palavras sem nexo.
De repente, as coisas que aconteceram há apenas um ano em lugares remotos, subdesenvolvidos – como para provar a sorte que tínhamos por pertencer à civilizada Europa – estão a acontecer agora, aqui, na Grécia. Mas os gregos não podem queixar-se, não podem reagir, porque lhes dizem que a culpa da crise é deles – mesmo quando toda a gente sabe que não pode ser apenas culpa deles.
Mas para além da cobertura mediática dominante e das declarações das elites e dos políticos, cada vez mais pessoas sentem a falta de sentido, de racionalidade, justiça e liberdade na sua vida cotidiana. Alguns recusam-se a pagar taxas sobre os transportes e nos hospitais, portagens e dívidas e outros criam pequenas redes de solidariedade locais, comércio alternativo ou auto-educação nos seus bairros. Alguns lêem blogues e contam histórias diferentes, reconfirmando a sua dignidade com actos humildes, diários, de resistência, porque sentem a diferença entre "nós" e "eles" que nenhum meio de comunicação social ou discurso estatal consegue obscurecer.
Um povo inteiro não pode viver no isolamento, sentindo medo e culpa por muito mais tempo, encarando um futuro cheio de problemas que não podem ser resolvidos. O que o FMI e os políticos gregos sabem e receiam é que um povo oprimido possa aprender a comunicar sem falar, a avançar sem parecer que se mexe, a resistir sem resistir - gradualmente as pessoas irão descobrir-se umas às outras e perceber o que se está a passar e de quem é realmente a culpa. E depois, como aconteceu em dezembro de 2008, haverá uma reacção em massa aqui na Grécia, uma reacção que poderá ser violenta e que irá uma vez mais ser classificada de imprevisível e irracional."
Testemunho de Hara Kouki, historiadora e investigadora grega.
(Texto publicado no "Guardian" e traduzido e transcrito no site "Controvérsia")
sexta-feira, 20 de maio de 2011
A UE imperialista e as lutas de massas em curso.
Na tarde de ontem, quinta-feira, 19 de Maio, muitos milhares de trabalhadores portugueses saíram às ruas em Lisboa e no Porto (50.000, em Lisboa, e 15.000, no Porto, segundo a CGTP), desfilando em manifestações patrióticas e de combate, prosseguindo assim a luta contra o assalto e a ingerência da "troika" imperialista (FMI/BCE/UE) e contra a submissão e a traição da "troika" dos partidos (PS/PSD/CDS) que estão ao serviço da primeira, combatendo energicamente as medidas de espoliação e sobre-exploração que estes congeminaram e continuam a preparar, pela surda, na mansidão dos seus gabinetes e nos encontros que têm com os banqueiros e outros representantes da grande burguesia nacional e europeia.
Entretanto, as lutas de classe prosseguem e redobram de intensidade também noutros países europeus, igualmente sob o fogo do ataque em larga escala que o grande capital desenvolve contra os povos. Da edição de ontem do jornal "Avante!", transcrevem-se as notícias sobre duas importantes jornadas de luta.
Após um ano de duras medidas de austeridade, que já retiraram um terço do poder de compra a amplas camadas de trabalhadores, muitos são aqueles que se interrogam: para onde foi o dinheiro? O descrédito dos partidos burgueses cresce à razão do agravamento dos problemas do país: o desemprego, que duplicou em menos de dois anos, atinge 15,1 por cento; as contas públicas degradam-se; o Estado resvala perigosamente para a bancarrota e volta a estender a mão à «ajuda» externa.
Sem outra cura que não provoque a morte do paciente, o poder burguês esforça-se para conter as convulsões das massas, manobra com mais promessas, abafa protestos com repressão, mas sente que a situação ameaça fugir ao seu controlo.
Na última semana, marcada pela grande greve geral de dia 11, que paralisou a generalidade dos sectores de actividade, os cordões policiais foram reforçados com novos contingentes, especialmente junto ao parlamento, local a que afluíram milhares de manifestantes.
A maior manifestação em Atenas, organizada pela PAME, a central sindical de classe grega, chegou ao fim sem incidentes. Porém, o desfile das centrais reformistas GSEE e ADEDY, no qual se infiltraram elementos provocadores, terminou em violentos confrontos com a polícia. Os agentes dispararam granadas de gás lacrimogéneo e atacaram brutalmente os manifestantes a pontapé e à bastonada. Uma das muitas vítimas foi levada para o hospital entre a vida e a morte.
Todavia, se os grandes bancos franceses e alemães, detentores de uma grande parte da dívida grega, podem esfregar as mãos, seguros de que continuarão a receber juros usurários, a esmagadora maioria do povo helénico está confrontada com uma deterioração sem precedentes das suas condições de vida.
As medidas preconizadas pelo governo visam mais cortes nos salários dos trabalhadores da administração pública e das antigas empresas públicas, nas prestações sociais, na Saúde, Educação, protecção e Segurança Social, a desregulamentação laboral e o aumento de impostos sobre o consumo.
No dia em que, pela segunda vez este ano, tudo estava parado na Grécia, não havia comboios nem barcos, jornais ou noticiários, a secretária-geral do Partido Comunista da Grécia, Aleka Papariga, presente na manifestação da PAME, acusou o governo de estar a conduzir o país para uma «bancarrota organizada e controlada» e sublinhou que ao povo trabalhador cabe «escrever em letras grandes a sua página na história deste país. A sua raiva precisa de se transformar em força para que possam passar ao contra-ataque. Não há outro caminho.»
As manifestações, convocadas pelo movimento «Democracia Real, Já», decorreram sob lema «Não somos mercadorias nas mãos dos políticos e banqueiros», e tiveram uma forte participação sobretudo de jovens estudantes, à procura do primeiro emprego ou em situação de precariedade, mas também de trabalhadores de vários sectores e reformados.
À semelhança do movimento português «Geração à Rasca», a plataforma foi lançada nas redes sociais da Internet. Teve origem nos meios universitários de Madrid, com a criação do grupo «Juventude sem Futuro», mas depressa ganhou o apoio de centenas de associações e organizações por todo o país, designadamente de ecologistas e da associação internacional ATTAC, que reclama a taxação das transacções financeiras, bem como de professores, poetas e escritores.
Os seus porta-vozes fazem questão de se demarcar dos partidos políticos e dos sindicatos, e alguns apelam mesmo ao abstencionismo eleitoral. No manifesto da «Democracia Real, Já», defendem a ideia de uma «revolução ética», todavia consideram «obsoleto e antinatural o sistema económico vigente», que «se consome a si próprio, enriquecendo uns poucos e afundando na pobreza e na penúria os restantes. Até ao colapso.»
Em Madrid, onde se concentrou o maior número de manifestantes, 25 mil segundo os organizadores, o desfile terminou, ao princípio da noite, na praça Porta do Sol, onde o escritor José Luis Sampedro, de 94 anos, instou os jovens a insurgir-se de forma pacífica contra a «tirania financeira e as suas consequências devastadoras». Posteriormente grupos radicais cortaram o trânsito e envolveram-se em confrontos com a polícia, que efectuou várias cargas para dispersar os manifestantes e fez várias detenções.
No entanto, um grupo de jovens decidiu ficar pacificamente na praça durante a noite, repetindo a acção na madrugada de terça-feira, quando, cerca das 5.30 horas, algumas centenas de jovens foram expulsos do local pela polícia.
Concentrações importantes tiveram ainda lugar, no domingo, em Barcelona (15 mil pessoas) – onde já na véspera se tinham manifestado perto de 30 mil pessoas contra os cortes sociais do governo catalão –, Valência (8 mil), Córdova (7 mil), Sevilha (6 mil), Granada, Saragoça, Múrcia, Las Palmas e Tenerife (5 mil em cada), Málaga e Alicante (4 mil), entre muitas outras. Em todas elas surgiram protestos contra as medidas de austeridade, o desemprego, os cortes nos salários e nas pensões: «Sem casa, sem trabalho, sem pensão e sem medo», tal é o lema da «Juventude sem Futuro» que promete mais mobilizações.
A Reuters apressou-se a dizer que tal termo - "re-profiling" - não existe no léxico financeiro. A ideia é levar os credores da dívida a aceitar a troca de dívida de menor prazo por dívida de longo prazo, permitindo um reescalonamento voluntário, estendendo as maturidades, evitando, formalmente, que se declare um "evento de crédito" (eufemismo técnico para default). A missão dos gregos - certamente com alguma "ajuda" da depressão política por parte das grandes potências europeias - será a de convencer os credores privados a aceitarem serem pagos mais tarde.
O processo da Grécia parece um filme em vários episódios, recorda Bastian. Começou com um resgate especial - ainda antes dos mecanismos depois criados a que já recorreram a Irlanda e Portugal -, depois foram estendidas as maturidades do empréstimo de 3,5 anos para 7 anos e foi reduzida a taxa de juro dos empréstimos da parte europeia de 5,2% para 4,2%. Em seguida, mais recentemente, começou a falar-se da necessidade de um plano suplementar - cujos valores variam entre €30 a 100 mil milhões, consoante as análises - ao resgate inicial que trouxe um envelope de €110 mil milhões. Finalmente, começa a soletrar-se a palavra "R".
Isto é, perante as lutas e o descalabro que as suas receitas de "ajuda" estão já a originar nos países que primeiro se renderam à sua aplicação (Irlanda e Grécia), o capital manobra simultâneamente com os seus dois propósitos clássicos: a) amortecer o impacto da luta dos trabalhadores e o reforço das suas alianças sociais com outras classes e camadas anti-monopolistas; b) tentar "sacar" pelo menos uma parte do planeado assalto aos rendimentos do trabalho, perante a perspectiva cada dia mais próxima e real de os povos agredidos constatarem a impossibilidade prática de o fazerem e se recusarem a pagar as dívidas dos banqueiros e dos grandes grupos económicos, com isso originando a temida bancarrota destes países e o correspondente colapso do sistema do euro.
A fecharmos este rápido painel da actualidade, dedicado aos últimos desenvolvimentos da renhida confrontação das antagónicas forças de classe no teatro europeu, mencionemos uma notícia de ontem sobre as declarações da representante do imperialismo anglo-franco-alemão, Ângela Merkel, acerca dos direitos laborais dos gregos, dos espanhóis e dos portugueses, a qual, usando termos de uma arrogância já descarada e desbragada, afirmou que os trabalhadores têm que passar a ter férias mais curtas e a só obter o direito à reforma nos anos de uma velhice mais avançada. Disse ela:
"Não se trata só de não contrair dívidas, em países como a Grécia, Espanha e Portugal, as pessoas não devem poder ir para a reforma mais cedo do que na Alemanha", afirmou a chanceler num comício partidário na terça-feira à noite, em Meschede (Renânia).
"Todos temos de fazer um esforço, isso é importante, não podemos ter a mesma moeda, e uns terem muitas férias e outros poucas", advertiu Merkel.
Esta "senhora", mentindo e ocultando, p. ex., o facto de os salários alemães serem qualquer coisa como seis vezes os salários dos portugueses e que os horários de trabalho na "sua" Alemanha são bem mais curtos e sem os prolongamentos ilegais que aqui se verificam e sem direito a qualquer pagamento extra, esta "Chefe", numa outra iniciativa da sua juventude partidária (neonazi?), afirmou também que a sociedade multi-cultural é "um modelo totalmente fracassado" (!)
Cada dia que passa fica assim mais claro que as classificações que vimos atribuindo à UE - federalista, ultraliberal e militarista - já são insuficientes. A estas torna-se agora indispensável adicionar-lhes outras, actuais: imperialista, xenófoba (mesmo já adentro das suas fronteiras!), ditatorial, neofascista.
E é a estas realidades que se deve prioritariamente atender, para se entender como se tornou prioritário e crucial reforçar os laços de solidariedade combatente entre as organizações comunistas e operárias que se batem, à frente dos seus povos, na luta anti-imperialista que travam contra as potências mandantes da UE, combatendo as suas criminosas ofensivas anti-operárias e anti-populares, defendendo com honra o direito à independência e à soberania dos seus países, hoje sujeitos a poderes ditatoriais por via das traições anti-patrióticas que diariamente são praticadas pelos seus governos e pelos partidos políticos que os apoiam.
Esta não é a Europa dos Povos, da Liberdade, da Solidariedade, da Democracia e da Paz. Esta UE é o inimigo nº. 1 dos povos europeus, o aríete imperialista usado para os subjugar e oprimir, o inimigo comum contra o qual os trabalhadores e os partidos operários devem cerrar fileiras, tendo por objectivo final a sua destruição e substituição por uma verdadeira União de povos soberanos, tendo por fundamento principal a livre cooperação, assente nos seus interesses recíprocos e mutuamente vantajosos.
No relacionamento entre partidos operários e movimentos sindicais de classe, talvez nunca antes como agora se deverá aplicar e cumprir escrupulosamente a conhecida consigna dos nossos clássicos: "Proletários de todo o Mundo, Uni-vos!"
quarta-feira, 27 de abril de 2011
Abril, Ano 2011, Portugal - A mudança está em marcha.
Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural nada deve parecer impossível de mudar."
(Bertold Brecht)
Vivemos em Portugal um novo período de viragem, com o país mergulhado numa profunda crise política, muito para além das "guerras(inhas) do alecrim e da mangerona" entre PS e PSD - essas são só meros afloramentos, contraditórios, de movimentos de classe mais vastos -, após a qual nada ficará como dantes, crise cujo traço central é o acelerado esgotamento de um regime podre e corrupto dito “democrático” que, nas últimas três décadas e meia, vem sendo conduzido à vez pelos partidos burgueses e orientado para a total subversão da democracia sonhada pela dupla que realizou a Revolução do 25 de Abril de 1974 - Povo/MFA, os obreiros do período mais luminoso da nossa história contemporânea.
Vivemos actualmente num regime político que pariu uma horrenda caricatura de democracia, uma mascarada pseudo-democrática marcada pela corrupção, pela violência social, pela repressão, pelo roubo dos recursos nacionais, pela submissão e humilhação do país perante os sucessivos “diktates” das potências imperialistas. Em síntese, afirmemo-lo com clareza, os portugueses sofrem hoje a opressão típica da ditadura - financeira, económica, social, política, cultural - própria das democracias burguesas, testemunhando e sofrendo a liquidação das liberdades, dos direitos e das conquistas transformadoras do nosso viver colectivo operadas no curtíssimo período histórico dos já distantes anos de 74/75 do século passado.
No quadro da aguda necessidade de uma actualizada reflexão e crítica, por parte dos comunistas e revolucionários, sobre as falsas concepções dominantes acerca do que é uma democracia – ou, mesmo, sobre o que é a democracia – surgem ultimamente valiosas iniciativas de análise e debate, artigos, ensaios, declarações cívicas, todos visando estudar e polemizar sobre os diversos significados políticos e de classe do conceito, cruzados com a realidade e com as suas práticas políticas concretas. Na segunda das três Conferências recentemente realizadas pela Associação Iuri Gagárin, sob o lema geral “Lenine e a Democracia”, o camarada Filipe Diniz proferiu uma intervenção que, pela actualidade e interesse relevante do seu conteúdo, pela contribuição que constitui para a busca dos novos caminhos, abaixo se transcreve:
Começarei por dizer que me seria muito menos difícil organizar esta intervenção sob o tema geral destas conversas, ou seja, Lénine e a democracia, do que sob o tema de hoje, A democracia liberta-se. E isto por uma razão teórica bastante simples: porque para Lénine, como antes para Marx e Engels, o processo da emancipação humana segue um caminho que, a certo passo do seu texto sobre “ O Estado e a Revolução”, Lénine sintetiza da seguinte forma: “quanto mais completa for a democracia mais próximo está o momento em que se tornará desnecessária. Quanto mais democrático for o Estado, […] mais depressa começará a extinguir-se todo o Estado”. Ou seja, a luta pelo socialismo - que é a luta pela supressão da exploração capitalista e de toda violência organizada e sistemática através da qual esta exerce o seu domínio, de toda a violência sobre os homens em geral - conduz necessariamente à supressão do Estado. E, para os marxistas, a democracia não é mais do que uma das formas de organização do Estado.
segunda-feira, 18 de abril de 2011
Unidade de Classe e Luta!
quinta-feira, 14 de abril de 2011
Os dias presentes são de resistência, de unidade e de luta!
