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segunda-feira, 15 de abril de 2013

Centenário de um Revolucionário - Páginas didácticas de História (V)

 
Vinte anos decorridos,  ao definir a concepção dos comunistas sobre as quatro vertentes da democracia, neste capítulo do texto da Conferência que realizou em 1993, as palavras de Álvaro Cunhal surgem-nos com surpreendente actualidade ao buscarmos uma caracterização do sistema de capitalismo monopolista de Estado hoje vigente em Portugal - como, de resto, na generalidade dos países capitalistas -, bem como dos traços essenciais do regime político que em Portugal lhe corresponde.
 
Esta "democracia" do grande capital, com crescentes traços de terrorismo social e tiques neofascistas, é um logro. Nada possui de democrática, não reflecte as aspirações e os interesses e direitos do povo português, é exercida num contexto de regime político corrupto, mafioso, cujas lideranças institucionais e dos partidos comprometidos em aplicar a "receita" dos últimos 37 anos são uma verdadeira escumalha social e moral, com alguns exemplos óbvios de psicopatas, indivíduos sem a mais ínfima réstia de humanismo.
 
Especialmente importante é esta afirmação de Álvaro Cunhal, sobre o exercício do poder político:
 
"O poder político é exercido directamente pelo grande capital (capitalismo monopolista de estado), ou indirectamente pelos seus agentes. Como garantia suprema, a democracia política num país capitalista é em geral concebida (nomeadamente através de sistemas eleitorais) de forma a impedir que os trabalhadores possam vir a substituir os capitalistas no governo."
 
Claro, claríssimo. Decorridas duas décadas, com os factos e a história do regime confirmando totalmente o acerto da definição, mais clara que nunca. Aí fica transcrito na totalidade o capítulo citado.
 
"As quatro vertentes da democracia
A relação entre o socialismo e a democracia foi ao longo do século e continua a ser na actualidade em Portugal e no mundo um dos grandes temas da luta ideológica e política.
 
A experiência do movimento revolucionário mundial e a experiência da nossa própria luta, confirma a ideia de que são inseparáveis e complementares quatro vertentes principais da democracia: a económica, a social, a política e a cultural.

Acrescente-se que a experiência confirma também que uma quinta vertente, a vertente nacional, a independência e soberania nacionais (que os processos de internacionalização e de integração podem por em causa) é com frequência necessária para assegurar num país dado (é o caso de Portugal) a democracia e o seu aprofundamento.

Da mesma forma, a experiência confirma, em sentido inverso, que governos ao serviço do capital desenvolvem, embora em graus diversos, uma actuação antidemocrática nessas mesmo quatro vertentes e frequentemente também uma actuação antinacional na quinta vertente indicada.

Há quem pretenda convencer que na sua prática política as quatro vertentes são separáveis. Há partidos que se afirmam grandes defensores da democracia política e ao mesmo tempo defendem — e quando no governo promovem — o domínio e o poder dos grandes grupos monopolistas e a liquidação de direitos e liberdades dos trabalhadores.
 
É porém fácil de ver que num país capitalista, à ausência de democracia económica e social correspondem com evidência graves limitações à democracia política.
 
Esta tese não é nova da nossa parte. O PCP assumiu uma posição crítica nomeadamente em relação aos chamados regimes de democracia burguesa parlamentar em países em que o sistema socioeconómico é o capitalismo monopolista.
 
Num país de capitalismo monopolista a democracia política tem uma natureza de classe e é fortemente condicionada e mesmo determinada por essa natureza de classe. O sistema de poder e o Estado são concebidos para garantir o domínio não apenas económico, mas político do grande capital. Embora a igualdade de direitos dos cidadãos seja reconhecida em termos legais, são impostas de facto gravíssimas discriminações e desigualdades. A abissal desigualdade económica e de meios financeiros e materiais entre as classes exploradoras e as classes exploradas, cria uma desigualdade efectiva no exercício das liberdades e direitos democráticos. O poder político é exercido directamente pelo grande capital (capitalismo monopolista de estado), ou indirectamente pelos seus agentes. Como garantia suprema, a democracia política num país capitalista é em geral concebida (nomeadamente através de sistemas eleitorais) de forma a impedir que os trabalhadores possam vir a substituir os capitalistas no governo.
 
Na situação portuguesa actual, a acção do Governo do PSD é um exemplo esclarecedor de ofensivas antidemocráticas simultâneas, complementares e inseparáveis nas quatro vertentes apontadas.

Na economia, reconstituindo e restaurando o capitalismo monopolista, promovendo a rápida centralização e concentração de capitais, acentuando a distância entre um pólo de grande riqueza acumulada e um pólo de pobreza e miséria.

Na social, promovendo o desemprego e a precarização do emprego, os despedimentos, os tectos salariais, a liquidação de direitos e benefícios sociais, a situação de miséria dos reformados e deficientes, a discriminação das mulheres, a degradação dos serviços de saúde, a habitação inacessível, o ensino vedado à grande massa dos jovens através do aumento das propinas.

Na política, desrespeitando a Constituição e a legalidade, governamentalizando e absolutizando o poder, liquidando mecanismos de fiscalização da acção governativa, espartilhando os direitos da oposição, criando novas polícias políticas, protegendo a própria corrupção, apossando-se e instrumentalizando grandes meios de comunicação social, elaborando novas leis eleitorais que lhe assegurem manter-se no poder mesmo quando em futuras eleições perca a maioria.

Na cultural, ressuscitando valores retrógrados e reaccionários e impondo uma política de partidarização e capela no ensino e na intervenção do Estado nas áreas das ciências e das artes.

Na nacional, tomando na CEE uma atitude submissa e de sacrifício dos interesses portugueses a interesses estrangeiros e fazendo ratificar o Tratado de Maastrich, atentatório da independência e soberania de Portugal.

Nós comunistas concebemos de forma diferente os elementos e os valores da democracia.

(in "O Comunismo Hoje e Amanhã", título da conferência proferida por Álvaro Cunhal a 21 de Maio de 1993, em Ponte da Barca. Texto já publicado anteriormente, no blog amigo "O Castendo" )


E, exactamente porque "nós comunistas concebemos de forma diferente os elementos e os valores da democracia", a situação actual aí está a exigir-nos um persistente e frontal combate às ilusões numa enganosa auto-regeneração do regime, a exigir-nos a construção, decidida e persistente, de uma solução política dos trabalhadores e do povo e para estes, contra a perpetuação do "status quo" só favorável às forças sociais e feitores políticos do grande capital.
A exigir-nos a intensificação e a alargamento da luta das classes em curso, unindo e mobilizando todas as energias sociais e sectores anti-monopolistas vitalmente interessados e que se afirmem disponíveis para o revolucionamento do regime actual, para a construção colectiva de uma real democracia, de uma democracia de e para a esmagadora maioria do povo.
 

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