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quarta-feira, 22 de agosto de 2012

A crise agónica da União Europeia - Dados úteis.

 
O euro e a "U"E agonizam penosamente. Os seus líderes políticos de turno manobram todos os dias para ocultarem, aos olhos dos trabalhadores e dos povos europeus, esse processo/realidade há muito em marcha. Nos grandes meios de manipulação de massas, surgem os mais diversos e contraditórios cenários evolutivos para esta UE ferida de morte pela crise sistémica do capitalismo, chegando já alguns a vaticinarem a saída do euro da sua principal criadora e beneficiária: a Alemanha! 
Este tipo de vaticínios não é totalmente destituído de racionalidade. No momento em que o grande capital alemão concluir que o euro já esgotou as suas funções drenadoras das riquezas e das economias dos países submetidos, não hesitará em retomar a sua moeda nacional, o marco, até como estratagema para manipulação dos sentimentos nacionalistas e xenófobos presentes na sociedade alemã. Ironicamente, alguns países do sul, hoje transformados em colónias-protectorados, se não despertam da letargia onde foram mergulhados e não se decidem à reafirmação vigorosa da sua independência nacional, rompendo com esta "U"E e reapossando-se da sua perdida soberania monetária, correm o risco sério de se verem repentinamente na humilhante situação de peças "descartáveis" de um edifício a fazer implodir. 
Em Portugal, a recessão e o desemprego agravaram-se no 2º trimestre deste ano. Em declaração recente do PCP, afirma-se: "(...) Enquanto o PIB caíu 3,3% no 2º trimestre do ano, o desemprego atingiu neste mesmo período os 826 900 desempregados em sentido restrito (15% de taxa de desemprego), enquanto o desemprego real ultrapassa já 1 milhão e 250 mil desempregados (21,8% de taxa de desemprego real).
Entre o 2º trimestre do ano passado e o 2º trimestre deste ano foram destruídos 204 800 empregos e mais 151 900 trabalhadores estão no desemprego. Enquanto a taxa de desemprego total aumentou no último ano 2,9 pontos percentuais, essa mesma taxa aumentou para os jovens trabalhadores 8,5 pontos percentuais passando de 27% para 35,5%.
A profunda recessão em que as políticas de direita têm vindo a mergulhar o nosso país, com cortes nos salários, nas pensões, nas reformas, no Serviço Nacional de Saúde, na Educação, nos apoios sociais às famílias, no subsídio de desemprego e no investimento público e privado, fazem com que a Procura Interna e o PIB esteja em queda há seis trimestres seguidos e fazem com que o desemprego de trimestre em trimestre suba para níveis inimagináveis há alguns anos atrás.(...)"
Um estudo de Edmilson Costa - Doutor em economia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) -, no capítulo onde trata da situação da crise do capitalismo na Europa, aponta alguns dados e avaliações que podem ser-nos úteis para o nosso combate. Eles aí ficam, à reflexão dos leitores.

A União Europeia é parte integrante do sistema imperialista mundial, especialmente a Alemanha, França, Inglaterra e Itália e o velho continente está também envolvido profundamente na crise sistémica global e sofrerá consequências semelhantes às que estão atingindo a economia líder, tendo em vista as interconexões entre o grande capital e as operações económicas cruzadas entre as várias fracções da burguesia dos países centrais. Acrescente-se a isso a identidade destas classes dominantes com o sistema político e económico neoliberal, implantado a partir do final da década de 70, com a eleição de Margareth Tatcher, na Inglaterra, e Ronald Reagan, nos Estados Unidos, além das próprias contradições do capitalismo europeu.
A formação da zona do euro, sob a orientação do Tratado de Maastricht, consolidou uma Europa do capital, no qual as fracções mais reacionárias da burguesia impuseram aos países participantes um conjunto de leis e regras que buscam garantir seus interesses económicos e políticos, às custas dos trabalhadores e dos povos europeus. Estruturou-se um conjunto de instituições regidas pelos interesses do grande capital, sob a óptica neoliberal, mesmo com este já moribundo, uma hierarquia draconiana entre as nações e um sistema esquizofrénico onde existe uma moeda única sem um Estado para respaldá-la, nem um emprestador de última instância; com um tecto de déficit público formal, irrealista, especialmente em função da crise e uma assimetria fiscal que torna a gestão macro-económica da política monetária uma lenda.
Apesar de ser parte do sistema imperialista mundial, a União Europeia possui um conjunto de singularidades que devem ser levadas em conta na análise desta crise. A primeira é a própria constituição do bloco económico, um processo que vem se consolidando há várias décadas e que criou certa identidade cultural entre os povos. A segunda é a criação de uma moeda única na zona do euro. Mesmo levando em conta a heterogeneidade das economias, o desenvolvimento desigual e as questões fiscais, o euro rapidamente se constituiu num importante instrumento de reserva dos bancos centrais, representando hoje 21% de todas as reservas em poder dos estados nacionais. Além disso, o próprio desenvolvimento desigual do capitalismo e os interesses dos diversos blocos das burguesias dos países centrais, criam necessariamente disputas entre as fracções do grande capital da União Europeia e as fracções dominantes do capital da economia líder e dos outros países imperialistas, o que se tem reflectido em decisões de política internacional e na própria gestão da crise europeia.
No entanto, o processo que atinge a Europa e que se expressa actualmente na crise das dívidas soberanas tem origem tanto nas contradições do capitalismo europeu e do seu modelo neoliberal atrelado à economia líder, quanto da opção dos seus governos em salvar os bancos com recursos públicos, cujo resultado levou ao acirramento da crise, com a ampliação extraordinária das dívidas soberanas.
Se observarmos a evolução das dívidas dos países europeus poderemos ver claramente o impacto fiscal das operações de salvamento dos bancos europeus:
A dívida total dos países da área do euro correspondia a 79,3% do PIB em 2008 e cresceu para 102,4% em 2011. Se observarmos isoladamente os diversos países da Europa, numa hierarquia inversa em função da crise veremos mais precisamente o impacto das operações de salvamento dos bancos. A dívida grega, que em 2008, era de 116,1% do PIB aumentou para 157,1% em Junho de 2011. A dívida portuguesa aumentou, no mesmo período, de 80,6% do PIB para 110,8%; a da Espanha de 47,4% para 74,8%; a da Itália, cresceu de de 115,2 para 129,0%; a da Irlanda de 49,6 para 120,4%; a da Inglaterra de 57% para 88,5%; a da França de 77,8 para 97,3%; e a da Alemanha de 69,3 para 87,3%.
[O Japão, o país membro da OCDE mais endividado, passou de uma dívida de 174,1 em 2008 para 212,7% em Junho de 2011. Em todos os países desta organização capitalista, o que se nota é um salto extraordinário no endividamento após a crise]
Apesar de a crise se expressar mais explicitamente na questão das dívidas soberanas, esta é uma crise do sistema como um todo. Sua expressão nas dívidas soberanas é apenas a face mais visível da crise sistémica global na Europa. Um dado importante a ser analisado é o fato de que as classes dominantes europeias, mesmo com a experiência da primeira onda da crise, continuam insistindo nos velhos métodos do passado como se essa crise não tivesse características inteiramente diferentes das crises anteriores. O mais grave desta cegueira política é o fato de que estão implementando um conjunto de medidas predatórias contra os trabalhadores que terão como consequência o aprofundamento da crise, que se espalhará para o conjunto das
economias capitalistas; a desagregação do sistema financeiro internacional tal como conhecemos hoje; a recessão prolongada, o aumento do desemprego e a crise social.
Vejamos mais detalhadamente os principais elementos dessa conjuntura explosiva. O ritual é mais ou menos o seguinte: parte expressiva dessa dívida foi incentivada pelos próprios bancos, no seu permanente desejo de lucro fácil e sem risco, uma vez que se imaginava que as dívidas dos Estados eram um porto seguro para as actividades bancárias. Com a crise de 2008, os Estados ampliaram de maneira extraordinária seu
endividamento para salvar o sistema bancário da falência. O sistema bancário ganhou sobrevida e impôs condições financeiras draconianas para os próprios países que lhes salvaram da bancarrota. Os Estados entraram em crise em função do aumento cada vez maior do serviço da dívida. Para garantir seus lucros, o sistema bancário vem pressionando as instituições e governos europeus para que imponham aos trabalhadores e ao povo em geral ajustes predatórios para que possam pagar a dívida.
Vale ressaltar que a troika (União Europeia, Banco Central Europeu e FMI) tem se comportado nesta crise como uma junta de representantes do grande capital. No entanto, as medidas tomadas até gora, tais como a criação do fundo de resgate, empréstimos bilionários ao sistema bancário, os torniquetes económicos impostos a países como a Grécia, Irlanda e Portugal, não foram suficientes para resolver a crise, pelo simples fato de que a crise sistémica que envolve o mundo capitalista não pode ser resolvida com medidas paliativas. Essas medidas apenas adiam o desfecho do processo. Se observarmos o tamanho das dívidas soberanas e os recursos que estão sendo organizados para resgatar as economias de um possível colapso, poderemos constatar que são absolutamente irrelevantes diante da dimensão do problema.
De fato, as dívidas soberanas dos países da zona do euro, conforme podemos observar na tabela, são inadministráveis, pois grande parte desses débitos ultrapassam 100% do PIB. Numa conjuntura de crescimento económico, as dívidas poderiam ir sendo roladas sem grandes problemas, desde que não ultrapassassem certos limites. No entanto numa conjuntura de crise, com recessão generalizada, desemprego, queda no consumo e na arrecadação tributária, a tendência é o aprofundamento da crise, fato que se concretizará à medida em que o primeiro País se declarar inadimplente, mesmo que este País não tenha grande expressão económica, tendo em vista a estreita relação entre o endividamento e os bancos da zona do euro. Os chamados mercados entrarão em pânico, contagiando todas as outras dívidas e se instalará o caos económico, um clima de salva-se quem puder, o que também atingirá em cheio a economia norte- americana.
Por falar na relação bancos europeus-dívidas soberanas , é necessário ressaltar que os bancos do velho continente estão profundamente envolvidos nesse processo e foram partícipes artífices do endividamento público. Em termos concretos, os bancos da Europa têm em carteira 3 trilhões de euros em títulos da dívida soberana, representando quase 8% de seus activos totais, o que por si só dá uma ideia da dimensão do problema. Se levarmos conta que a crise de 2008 levou à nacionalização de vários conglomerados financeiros europeus, imaginem o que poderá acontecer ao sistema bancário se ocorrer uma onde de calote soberano não apenas na Grécia, Portugal ou Irlanda, mas em países como Espanha ou Itália ou mesmo a França?
A cegueira do grande capital e seus representantes políticos diante da crise é tamanha que agora eles resolveram, num gesto desesperado, deixar de lado as aparência e intervir directamente nos países com crises mais explícitas e exercer diretamente o poder político nas instituições e governos da região. É o caso dos pró-consules da Goldman Sachs que assumiram o poder na Europa. Ferina ironia: os homens que fabricaram a crise estão agora comandando o poder económico e político na Europa. Sob a protecção da manipulação mediática, que os apresenta como um “governo técnico”, eles estão encarregados de implementar o trabalho sujo, que consiste em saquear as economias nacionais, privatizar o património público, aumentar os impostos, ampliar o desemprego, cortar os salários, as pensões, reduzir o padrão de vida dos povos para satisfazer o apetite voraz do capital financeiro.
Vejamos quem são esses personagens: Mário Draghi, antigo vice-presidente e membro do Comité de Administração da Goldman Sachs, que tinha como uma de suas funções vender swaps aos países europeus, agora é presidente do Banco Central Europeu (BCE); Mario Monti, ex-presidente da Comissão Trilateral, do grupo Bilderberg, também assessor internacional da Goldman, agora é o principal dirigente político da Itália; Lucas Papademos, ex-governador do Banco Central Grego, participou das operações de falsificação das contas do País a serviço da Goldman, agora é o líder político da Grécia; além de outros personagens influentes na Europa e que participam da rede da Goldman na região. Em relação a esses personagens, vale o que disse certa vez Alessio Rastani, ex-trader, numa entrevista à BBC que chocou os mais desavisados: “Os políticos não governam o mundo. A Goldman Sachs governa o mundo”.
Essa acção desesperada do grande capital na Europa pode ser o canto dos cisnes antes da tempestade, mas vale uma advertência: a acção ousada do capital representa um perigo para o padrão de vida não apenas dos trabalhadores e da população em geral, mas para a própria democracia, pois a burguesia, em sua busca desesperada para sair da crise não apenas vem colocando todo o custo da crise na conta dos trabalhadores, como também não hesitará em atropelar a democracia e criar um clima de terra arrasada, caos, instabilidade, para atingir seus objectivos, instalando governos de carácter fascista, como ocorreu na Alemanha e Itália na década de 30, com as consequências que todos conhecemos.

O alerta final deste autor deve ser levado muito a sério. O grande capital, a grande burguesia "globalizada", pelo seu criminoso cortejo de crimes todos os dias cometidos, já nos provou há muito que não hesita um segundo em mandar às urtigas a "sua" democracia burguesa, se o "sacrifício" dessa sua fachada democrática lhe for necessário para defender os seus interesses de classe. Entretanto, tal possibilidade neofascista não se combate e faz abortar com passividades e resignações, guiadas pelo oportunismo político; ao contrário, combate-se com a luta vigorosa dos povos contra esta "U"E e por novos poderes políticos nacionais anti-monopolistas, exercidos pelos trabalhadores e ao serviço dos trabalhadores e das restantes camadas sociais igualmente espoliadas pelos banqueiros e grandes grupos económicos que comandam os seus governos de serviço.
No confronto em curso, na renhida luta de classes em desenvolvimento, o tempo não é uma categoria abstracta. Quanto mais tarde, quanto mais adiado for esse renascer democrático e patriótico, maiores perigos para a liberdade e pior para os explorados e para os povos. A todos quantos trabalham e do trabalho dependem para sobreviver e a cada um - individual, directamente - devemos colocar a questão: estás descontente, ambicionas libertar-te da exploração e da humilhação presentes? Já não acreditas nem suportas estes "políticos" que te mentem descaradamente todos os dias, a toda a hora? Também não votaste "neles"? Então, diz-me: o que estás tu disposto a dar e a fazer pela transformação revolucionária desta situação pantanosa, perigosa e que nos conduz ao abismo, se nada fizermos para a estilhaçarmos? Da tua resposta, directa - pessoal e intransmissível - muito (tudo?) depende o nosso futuro colectivo, como classe e como povo. Não te atrases, não te distraias com pantominices, não acredites que tudo se resolverá a bem, não entregues a outros a defesa dos teus direitos e interesses de classe. Só com a tua força - com a nossa força organizada - os vergaremos e derrotaremos! O futuro, conquista-se - não se aceita passivamente.