SÓ NÃO SE ENGANA QUEM CEDE AO MEDO DE CAMINHAR NO DESCONHECIDO - SÓ SE PERDE AQUELE QUE NÃO ESTÁ SEGURO DO RUMO QUE ESCOLHEU.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

"Assim [aqui], se vê [e reside], a força do [nosso] PC!"

Trabalho colectivo, direcção colectiva, democracia interna - Algumas notas


Entre as concepções e actividades de um partido comunista, de um partido revolucionário como o PCP, que tem como objectivo levar a cabo transformações revolucionárias profundas na sociedade portuguesa, e as concepções e actividades reformistas de um partido social-democrata como o PS, por exemplo, há barreiras intransponíveis. Sempre, ao longo da história, os partidos sociais-democratas pretenderam fazer aceitar pelos trabalhadores a exploração e domínio capitalistas, convencê-los a integrar-se pacificamente no sistema, espalhando aos quatro ventos velhas e gastas teorias de um «capitalismo civilizado» capaz, até, de resolver os problemas maiores dos trabalhadores e apregoando as suas políticas de «conciliação de classes».
É, portanto, natural que entre estes dois partidos, com objectivos programáticos diferentes, práticas políticas diferentes, actividades diferentes, sejam igualmente diferentes os princípios que regem o seu funcionamento interno, o seu estilo de trabalho, os direitos e deveres dos seus membros.
A preparação dos Congressos do PCP, e o XIX não é excepção, é mais uma prova, a somar a tantas outras, que mostra à evidência que o PCP é um partido distinto de qualquer outro partido existente em Portugal. Um Partido que a par dos deveres que coloca aos seus membros lhes confere, simultaneamente, importantes e amplos direitos, iguais para todos.
E esta constatação é válida não só em relação aos Congressos que tem realizado depois do 25 de Abril de 1974, em condições de liberdade (e já são 13), mas também em relação aos Congressos que se realizaram nas duras condições da ditadura fascista (e foram 4). Realizados, estes, em condições extremamente difíceis de clandestinidade, colocaram, inevitavelmente, fortes limites à observância dos seus princípios de funcionamento e exercício de alguns direitos democráticos pelos seus membros.
Apesar dessa situação, as preocupações com o trabalho colectivo, direcção colectiva, o respeito pelas opiniões dos militantes, o procurar a maior participação possível dos membros do Partido na elaboração da sua linha política e nas grande decisões políticas estiveram sempre presentes, particularmente depois da reorganização de 1940-1941, nos anos de 1943-1949. E é oportuno evocar aqui as palavras de Militão Ribeiro na carta ao Partido, escrita com o seu próprio sangue, em vésperas do seu assassinato, em 1949, na Penitenciária de Lisboa:
«Tenho confiança que sabereis vencer todos os obstáculos e levar o povo à vitória, mantendo essa disciplina e controle severo de uns sobre os outros, em trabalho colectivo, como vínhamos fazendo e aperfeiçoando... Felizes dos que vêm novos ao Partido e o encontram a trabalhar desta forma» («Avante!», Janeiro de 1950).
E se, nalguns momentos complexos da sua história, princípios e normas da vida interna do Partido estiveram ausentes ou foram ignorados, foi a sua actividade geral que disso se ressentiu e a sua própria sobrevivência ameaçada.
Não tivesse sido até hoje o princípio revolucionário leninista do centralismo democrático a pedra de toque do funcionamento do PCP, e o PCP não seria o Partido que hoje é: um partido que, através de todas as vicissitudes históricas que enfrentou ao longo do seu desenvolvimento e amadurecimento, se constituiu como «o partido político do proletariado, o partido da classe operária e de todos os trabalhadores portugueses». Um partido que imprimiu traços profundos e valores inalienáveis aos seus militantes: o sentido de responsabilidade, o respeito pelos valores democráticos, o apego à democracia: à democracia no seio do Partido, à democracia no seio da sociedade. A participação directa na vida do Partido, na sua luta, acompanhar o pulsar de toda a sua actividade no dia a dia tem sido, será sempre, uma verdadeira escola de democracia.
Ao decidir a convocação do XIX Congresso do Partido, na sua reunião de 8 de Dezembro de 2011, o Comité Central, desde logo, fez recair sobre todos os militantes comunistas uma acrescida e pesada responsabilidade: a sua participação, a sua intervenção activa em todo o processo preparatório que se tem vindo a desenvolver e que culminará nos dias 30 de Novembro, 1 e 2 de Dezembro com a realização do Congresso. Um Congresso que vai ter lugar no quadro de uma situação nacional e internacional de grande complexidade e de grandes exigências, e, em simultâneo, de crescente desenvolvimento da luta popular de massas que se regista de dia para dia.
Quando este número de «O Militante» chegar às mãos dos membros do Partido, está ainda em curso, mas próxima da conclusão, a terceira fase preparatória do Congresso, fase indiscutivelmente decisiva, com o debate em todo o Partido do Projecto das Teses/Resolução Política e do Projecto de Alterações ao Programa e a eleição dos delegados em Assembleias Plenárias.
A participação nos debates realizados no organismo a que pertence, nos plenários da sua organização, nas assembleias, conferências e congressos para que for eleito, em todas as reuniões do Partido em que participe, contribuir para a elaboração da linha política do Partido é, de acordo com os Estatutos, simultaneamente um dever e um direito de todos os seus membros.
A questão dos deveres e direitos do membro do Partido é o cerne de toda a sua organização e que emana do centralismo democrático.
Nenhum outro partido em Portugal tem qualquer semelhança com o PCP. O PCP não reduz a democracia interna à eleição dos seus órgãos dirigentes como outros partidos fazem, transportando para o seu interior as normas e métodos do parlamentarismo burguês.
Na sua obra «O Partido com Paredes de Vidro», da maior actualidade para os dias de hoje, Álvaro Cunhal sublinha que o trabalho colectivo, tendo como primeira e fundamental expressão a direcção colectiva, constitui um princípio básico do PCP.
Ao referir, na sua obra, como a direcção colectiva e o trabalho colectivo se desenvolveram no Partido e resultaram de um processo longo e irregular em que intervieram e se somaram numerosos factores, Álvaro Cunhal põe em destaque:
«A direcção colectiva e as suas experiências positivas abriram caminho ao alargamento do conceito de trabalho colectivo, não apenas à direcção central mas a todos os outros organismos do Partido e, ulteriormente, acompanhando todo um profundo processo de democratização, a toda a actividade partidária.» (p. 84)
«O trabalho colectivo tornou-se uma característica fundamental do estilo de trabalho do Partido, um dos aspectos essenciais da democracia interna e um factor decisivo da unidade e da disciplina.» (p. 85)
«O trabalho colectivo conduz à responsabilidade e à responsabilização colectivas. Mas não apaga, e muito menos extingue, a responsabilidade e a responsabilização individuais
«Nem a responsabilidade do indivíduo se deve encobrir com a responsabilidade do colectivo, nem a responsabilidade do colectivo se deve encobrir com a responsabilidade individual
«Atirar a responsabilidade do indivíduo para o colectivo e do colectivo para o indivíduo são formas de alijar a responsabilidade, afectando a própria ideia da responsabilidade consciente e voluntária.» (p. 95)
A participação directa ou indirecta dos membros do Partido na sua actividade, nas suas decisões, o trabalho colectivo, a direcção colectiva são a essência da democracia interna no PCP.

(Artigo publicado em "O Militante", nº. 321, Nov/Dez-2012)


Complementando, aqui se deixa uma outra transcrição daquela obra maior de Álvaro Cunhal, sobre o mesmo tema e já anteriormente publicada neste blog (O Partido com Paredes de Vidro - Releituras (VI):

O trabalho colectivo no Partido tem como principais aspectos: a compreensão e a consciência de que a realização com êxito das tarefas do Partido se devem aos esforços conjugados e convergentes de todos os militantes que, directa ou indirectamente, intervêm nessa realização; e a mobilização dos esforços, do trabalho, do apoio de todos os militantes chamados a intervir na realização de qualquer tarefa.
O trabalho colectivo é uma dinâmica permanente no desenvolvimento da actividade do Partido e de todos os militantes.
A preparação, organização e realização das acções de massas, das grandes iniciativas, das assembleias das organizações, dos encontros e conferências, das conferências nacionais e dos congressos do Partido constituem exemplos esclarecedores e exaltantes do trabalho colectivo do Partido como um dos traços fundamentais dos métodos e do estilo de trabalho.
A expressão «o nosso grande colectivo partidário», que se tornou usual na boca dos militantes (e se oficializou a partir do X Congresso), traduz a participação, a intervenção e a contribuição constante dos colectivos, a busca constante da opinião, da iniciativa, da actividade e da criatividade de todos e de cada um, a convergência das ideias, dos esforços, do trabalho das organizações e militantes no resultado comum.

Parafraseando as palavras de Militão Ribeiro na sua carta ao Partido, felizes os novos e os velhos que militam e intervêm para garantir a continuidade destes métodos democráticos de funcionamento e do estilo próprio e inconfundível do seu Partido.

domingo, 18 de novembro de 2012

Após uma grande Greve Geral, porquê a provocação?


 
Eles e nós, sabemos que o seu projecto de "refundação" do Estado é de carácter global, integra as várias componentes das funções de um Estado ao serviço do capitalismo monopolista de Estado: financeiras, económicas, sociais, culturais/ideológicas, políticas, repressivas.
Exactamente por isso, eles e nós sabemos que um regime neoliberal, fustigado crescentemente pela luta do Movimento Operário e Sindical, contestado nas ruas pelas massas populares, só pode manter-se pelo recurso à repressão e à liquidação do que resta das liberdades ainda sobreviventes, após 36 anos de política contra-revolucionária e restauracionista. Isto é, necessitam de reconstituir um regime de características neofascistas, ainda que disfarçado com roupagens "democráticas".

De facto, está em marcha um golpe de Estado institucional, um real "regresso ao passado (em muitos aspectos ao passado anterior ao 25 de Abril) [que]está na reestruturação e restauração dos grupos monopolistas, alguns deles do tempo do fascismo, na liquidação dos direitos dos trabalhadores, na perversão da democracia política, na degradação cultural, na capitulação perante o estrangeiro e nas alianças internacionais com as forças mais retrógradas do mundo actual"(Álvaro Cunhal, 1994).

As duas fotos da provocação, publicadas entre muitas outras e cobrindo os minutos que antecederam a carga da polícia de choque sobre populares indefesos, são bastante esclarecedoras.  Mostram, indiscutivelmente, que o indivíduo em causa, fotografado quando actuava como um "ultra-esquerdista", é o mesmo que está na terceira foto, enquadrado entre os polícias do corpo de intervenção. Que mais confirmações documentadas são necessárias? E agora? O que vão fazer as várias "instituições democráticas"? Responda quem melhor souber. Mas todos nós, democratas e patriotas - integrantes ou não das ditas instituições - temos uma palavra a dizer.

Estes métodos, sobejamente conhecidos, são utilizados hoje por regimes autoritários e neofascistas, ao serviço do capitalismo monopolista de Estado - mais próximos de nós, são visíveis, p. ex., em Espanha, na Itália, na Grécia - contra as lutas dos trabalhadores e dos povos, à medida que estes vão alargando e intensificando a luta de classes.

Por agora, a manobra provocatória mereceu a destrinça do ministro - e do Seguro/PS...- mas tal "desculpabilização" da CGTP é meramente táctica, faz parte de uma estratégia em marcha. Agora, são a liberdade e o direito à manifestação o alvo imediato, alvo já descaradamente verbalizado por um deputado do CDS; a seguir, será a própria CGTP, os comunistas, depois os socialistas sinceros,  os outros democratas e patriotas que resistem e lutam, por fim será todo o Povo, com a supressão "legal" das liberdades políticas.

Estamos a entrar numa nova fase, na qual a denúncia firme e corajosa destas práticas provocatórias é parte integrante da luta geral contra as troikas e o seu governo de turno. As práticas e as ameaças neofascistas estão aí. Ou somos nós que as derrotamos, ou seremos nós, democratas, os derrotados. Denunciá-las, isolá-las, combatê-las, tornou-se um dever e uma prioridade para todos nós.


terça-feira, 13 de novembro de 2012

Em Portugal, Viva a Greve Geral!





Já esta esta noite, inicia-se mais uma Greve Geral em Portugal. Arma política nas mãos dos trabalhadores portugueses, será empunhada com coragem e com determinação contra os seus inimigos de classe -  os banqueiros e monopolistas, exploradores da sua força de trabalho -, contra o governo de turno destes e contra as "troikas" que os servem e apoiam: a interna - PS/PSD/CDS - e a externa - FMI/BCE/CE -, responsáveis políticos pela marcha do país para o abismo, liquidando o aparelho produtivo, destruindo liberdades, direitos, conquistas sociais de décadas, mergulhando os trabalhadores e o povo na maior crise nacional desde a época fascista.
 
São muitos e muito calorosos os sinais que nos chegam de uma vasta disposição do proletariado, apoiado por outras camadas sociais, para uma grande adesão a esta GG de 14 de Novembro. O divisionismo sindical amarelo, protagonizado pela UGT, vem sofrendo derrotas fragorosas na suas manobras anti-operárias, com várias dezenas de sindicatos e estruturas suas a anunciarem que aderem à GG. Numerosas administrações, percebendo este clima de apoio dos trabalhadores à GG, manobram para minorar as seus prejuízos de classe e o impacto da grande adesão que se vive.
Serviços mínimos em sectores estratégicos são deixados cair, perante a perspectiva da sua ineficácia. Os partidos do capital e o governo, permanecendo silenciosos ou com declarações pias de respeito pelo direito dos trabalhadores à greve (!), revelam percepcionar uma grande adesão e quererem esquivar-se a maiores estragos políticos.
 
Vivendo a realização de uma grande jornada de luta dos trabalhadores portugueses, a sua luta também contribui poderosamente para as greves e manifestações de luta em outros países da UE, igualmente fustigados pela brutalidade das políticas de espoliação que a todos nos atinge. Ponto alto da unidade na acção dos proletariados que estarão em luta na mesma data, esta unificação do combate não esconde o carácter central e decisivo da nossa luta no terreno nacional, face a face com o grande capital e com o governo "português" que o serve e trai os interesses nacionais do povo português.
 
Dia grande, na marcha dos trabalhadores portugueses pela sua emancipação, a sua luta contra este criminoso capitalismo monopolista de Estado - cada dia acentuando mais os seus traços neofascistas -, será também um poderoso estímulo e  um contributo para a unidade de todos os democratas e patriotas, conclamando-os à acção em defesa das liberdades e da dignidade violentada de um povo inteiro, um povo atingido por políticas de autêntico terrorismo social e ideológico por aqueles que entregam aos interesses capitalistas estrangeiros a nossa soberania e o nosso futuro. Pela luta, não passarão!  
 
 

sábado, 10 de novembro de 2012

"Valores de Abril no Futuro de Portugal"

 




Assinalando nesta data o aniversário do nascimento do camarada Álvaro Cunhal, transcreve-se abaixo um capítulo da sua obra "A Revolução de Abril 20 Anos Depois", cujo título dá o nome a este post.


Valores de Abril no futuro de Portugal

Após quase meio século de tirania, opressão, exploração, atraso, submissão nacional, a revolução de Abril representou uma transformação profunda e um progresso notável da sociedade portuguesa. Ao contrário do que a ideologia e a propaganda das forças do capital actualmente procuram gravar na memória e na consciência dos Portugueses, as grandes conquistas democráticas da revolução de Abril (regime democrático com órgãos de soberania interdependentes, um poder local fortemente descentralizado, múltiplas formas de democracia participativa, exercício sem discriminações de liberdades e direitos, direitos dos trabalhadores, liquidação do capitalismo monopolista com as nacionalizações, reforma agrária na grande região do latifúndio) correspondiam a exigências de natureza objectiva para o desenvolvimento do país e às necessidades e aspirações profundas do povo português. Dois factos o evidenciam.
O primeiro é que tão profundas e radicais transformações tiveram lugar, pela impetuosa e irresistível acção das massas populares, num espaço de tempo extraordinariamente curto, vencendo sem uso da violência todas as violentas resistências contra-revolucionárias.
O segundo é que a liquidação dessas conquistas democráticas, apesar de constituir a partir de 1976 o objectivo estratégico, se bem que não declarado durante vários anos, de sucessivos governos (do PS, do PS/CDS, de «iniciativa presidencial», do PSD/CDS, do PS/PSD, e finalmente do PSD) e das novas hierarquias militares que se sucederam à liquidação do MFA, tem levado até hoje cerca de 17 anos de contínuas ofensivas conduzidas pelos órgãos do poder e ainda não está completada ao perfazerem-se 20 anos do 25 de Abril.
A situação para a qual a política de direita está arrastando Portugal, é contrária a interesses vitais do povo e do país. O sistema socioeconómico (capitalismo monopolista de Estado), o regime político (formalmente democrático mas de cariz autoritário e ditatorial), direitos nacionais (independência e soberania submetidos a decisões supra nacionais), a concretizarem-se completamente os objectivos estratégicos das forças de direita no poder, significaria um verdadeiro desastre para o povo português e para Portugal, com duradouras e trágicas consequências. Não se trata de uma visão «catastrofista» da realidade como dizem alguns. A realidade da política contra-revolucionária de direita é que encerra elementos de catástrofe.
Só a cobardia oportunista pode justificar, da parte de forças que insistem em afirmar-se de esquerda, que se considere inevitável e irremediável tal evolução dos acontecimentos e, em consequência, se aceite a renúncia à luta por soluções democráticas e se opte pela acomodação, adaptação e integração no novo regime e no novo sistema.
Há que ter em conta com toda a objectividade a situação actual, tanto nacional como internacional. Há que definir objectivos, soluções e caminhos que permitam travar e impedir a total concretização do processo contra-revolucionário conduzido pelo governo de direita. Há que considerar que Portugal é hoje membro de uma Comunidade Europeia que com decisões supra nacionais afecta gravemente o nosso desenvolvimento e põe graves limitações à nossa independência nacional, pelo que exige um governo português que não capitule perante interesses estrangeiros e determinado a defender com firmeza os interesses nacionais. Há que avaliar e saber movimentar e fazer convergir as forças sociais e políticas cuja luta é indispensável para alcançar tal resultado. São necessários entendimentos e plataformas. Esses objectivos não podem porém significar que se deixem de definir objectivos a curto, a médio e a longo prazo e que se deixe de definir, apresentar e propôr a política que se considera necessária ao povo português e a Portugal.
Neste sentido a análise da evolução da sociedade portuguesa ao longo do século, do que foi o fascismo, do que foi a revolução democrática, do que tem sido e é a contra-revolução, conduz à conclusão de que, como noutro local se afirmou, «os grandes valores da revolução de Abril criaram profundas raízes na sociedade portuguesa e projectam-se como realidades, necessidades objectivas, experiências e aspirações no futuro democrático de Portugal».
Isto não significa que se aponte para o futuro democrático de Portugal como uma repetição da revolução inacabada. Nem que se repitam literalmente as soluções. Experiência significa aprendizagem e aprendizagem significa enriquecimento democrático do projecto e do programa.
Falando do passado e do futuro, cabe ainda dizer que um dos maiores logros da propaganda antidemocrática é a afirmação de que a política que o PCP propõe é o «regresso ao passado» e a política do PSD é uma política voltada para o futuro. A ideia verdadeira é precisamente a inversa.
O regresso ao passado (em muitos aspectos ao passado anterior ao 25 de Abril) está na reestruturação e restauração dos grupos monopolistas alguns deles do tempo do fascismo, na liquidação dos direitos dos trabalhadores, na .perversão da democracia política, na degradação cultural, na capitulação perante o estrangeiro e nas alianças internacionais com as forças mais retrógradas do mundo actual.
Uma política voltada para o futuro é aquela que propõe o PCP: estruturas socioeconómicas para promoverem o desenvolvimento económico nacional, o melhoramento das condições de trabalho e de vida do povo, a solução dos grandes problemas sociais como a saúde, a habitação e o ensino, uma democracia política com forte componente participativa, a generalização da criação e da fruição culturais, o aprofundamento da democracia no quadro da independência e soberania nacionais. Ou seja: o projecto e programa de uma democracia que, respondendo às mudanças no mundo e no país, tendo em conta as experiências positivas e negativas, dando respostas novas e criativas às novas situações, aos novos fenómenos e às novas realidades, se afirma na coerente continuidade histórica dos ideais, conquistas, realizações e valores da revolução de Abril.

(Cunhal, Álvaro (1994), "A Revolução de Abril 20 Anos Depois". Lisboa, Edições "Avante!", 2ª.ed.: 42-45)
(Os sublinhados são os do original)


Decorridos desde então mais tempo que os dezassete anos "de contínuas ofensivas conduzidas pelos órgãos do poder" de que falava o autor (passaram mais dezoito!) estávamos naquela época ainda a meio do caminho da grave evolução da situação política do país até aos dias de hoje.
Vale a pena reflectirmos naquilo que Álvaro Cunhal avaliava e na marcha posterior que o processo contra-revolucionário de destruição do património de Abril entretanto revelou. Confirmando, aliás, todas as suas ideias, seja quanto ao papel revolucionário originário desempenhado "pela impetuosa e irresistível acção das massas populares", seja quanto ao rumo negativo posterior e suas consequências - pela mão dos sucessivos governos do capital - que já se divisavam nítidas nesse ano distante de 1994.

Particular significado terá, até pela identificação óbvia do título do capítulo, pensarmos atentamente na contradição que se revela na comparação entre os valores de Abril e as realidades actuais que tão profunda e criminosamente os renegam, tanto quanto ao sistema sócio-económico, como quanto ao regime político. Estamos hoje vivendo aquilo que Álvaro Cunhal designava como "um verdadeiro desastre para o povo português e para Portugal".


Um quadro de emergência nacional, consubstanciado num autêntico golpe de Estado institucional, quadro que nos chama ao combate para resgatarmos tudo aquilo que foi destruído, concretizando plenamente os valores revolucionários e transformadores da nossa Revolução de Abril, através da audaciosa construção de uma nova arrancada democrática, com as lutas do Movimento Operário à cabeça de um novo levantamento nacional e patriótico das massas populares, um levantamento popular de novo impetuoso e irresistível.

Um movimento dotado de organicidade própria, que urge "organicizar" como a prioridade política que hoje é, destacando os meios humanos indispensáveis e multiplicando as iniciativas, os contactos, construindo persistentemente as ligações e pontes necessárias entre todos os democratas portugueses que rejeitam o actual caminho, um rumo que nos conduz ao desastre nacional há muito anunciado. Edificando uma aliança política dinâmica entre todas as classes e camadas sociais não-monopolistas. Porque é urgente vencer o bloqueio institucional-parlamentar que PSD, CDS e PS há muito protagonizam. Porque urge travarmos e derrotarmos o golpe de Estado em desenvolvimento e os golpistas.