SÓ NÃO SE ENGANA QUEM CEDE AO MEDO DE CAMINHAR NO DESCONHECIDO - SÓ SE PERDE AQUELE QUE NÃO ESTÁ SEGURO DO RUMO QUE ESCOLHEU.

domingo, 10 de abril de 2011

Carpe Diem (III) - O povo islandês volta a dizer "Não"!

"MAGNÍFICA VITÓRIA DO POVO ISLANDÊS !
No referendo de 9 de Abril de 2011 o povo islandês deu uma magnífica prova de lucidez, consciência e civismo ao votar "Não" ao pagamento das dívidas dos banqueiros corruptos do Icesave. Trata-se de uma vitória histórica e que ficará registada na história económica mundial. Apesar das pressões brutais feitas em favor do "Sim", com ameaças de toda espécie por parte da União Europeia, do FMI, das agências de classificação, dos governos britânico e holandês e dos políticos locais que dominam o parlamento e cozinharam um acordo dito "menos mau" que o anterior (rejeitado num primeiro referendo), o povo islandês soube ver onde estavam os seus verdadeiros interesses. Contados 36 mil votos, os números oficiais mostram que o campo do "Não" tem 56,8 por cento e o do "Sim" apenas 43,2 por cento (1) . Deve-se registar a dignidade e coragem do Presidente da República da Islândia, que soube enfrentar pressões para ratificar o acordo cozinhado pelo parlamento e exigiu a sua ratificação em referendo popular."

(in "Resistir.info")


Espantosa e exaltante notícia esta! Para melhor a enquadrar, esta outra notícia, de ontem, sobre o contexto deste segundo referendo ontem realizado na Islândia:


"Protestos contra pagamento de dívidas de banco privado que faliu levaram o presidente a querer dar voz ao povo. Há 230 mil islandeses inscritos para o referendo de hoje, o segundo no país desde a eclosão da crise financeira mundial. Depois de o povo ter ido às urnas decidir se aceitava ou não que o Estado (leia-se, os contribuintes) pagasse o resgate dos três bancos privados islandeses que abriram falência na semana em que o Lehman Brothers colapsou, em 2008 - votando em massa contra o resgate e levando à nacionalização das três instituições - hoje o povo manifesta-se quanto ao pagamento das dívidas contraídas por uma delas, o Landsbanki, no Reino Unido e na Holanda. Com o colapso do Landsbanki, que acumulava a maior dívida dos três, os governos britânico e holandês avançaram com uma indemnização aos seus cidadãos com conta nesse banco, pagando um total de cerca de 3,5 mil milhões de euros e planeando a cobrança desses valores à Islândia. Mas à semelhança do que aconteceu em 2009 - quando protestos pacíficos em frente ao Parlamento islandês durante vários dias levaram à queda do governo conservador de Geir H. Haarde -, o povo voltou a manifestar-se contra o pagamento de dívidas que, sublinha, não são suas. O presidente islandês entrou em acção e convocou o plebiscito. Contudo, a nova questão em referendo não é tão simples como a do anterior. E o povo parece estar dividido. "Há uma semana, teria dito que a Islândia provavelmente votaria sim [ao pagamento da dívida]. Contudo, neste momento, sinto que a votação vai ser renhida. O campo do ''não'' tem estado a ganhar terreno e o que acontecerá amanhã é imprevisível", explica ao i Alex Elliott, editor do Icenews.is. "Mas se eu tivesse mesmo de dizer qual delas ganha, provavelmente apostaria, ainda assim, que a lei vai passar - mas não por muito." As últimas sondagens mostram que 55% dos islandeses parecem estar dispostos a aceitar as condições de pagamento propostas na lei que o Parlamento aprovou, o Acordo Icesave - que corresponderá a 6 mil dólares por cada um dos 320 mil habitantes do país, pagos mensalmente por cada família a 15 anos, com juros de 5,5%. Lee Bucheit, que liderou a equipa de negociações entre a Islândia e os governos britânico e holandês, diz que o país não podia ter desejado um acordo melhor. Mas só amanhã se comprovará se a população está do seu lado. E se? As discussões sobre a situação na Islândia têm escalado de nível, com a aproximação da data. Um islandês a viver nos EUA, Baldur Hedinsson, criou um inquérito no seu blogue para que as pessoas o aconselhassem sobre o voto. O debate levou a questões pertinentes e uma dúvida surgiu. E se o "não" ganhar? Elliott deu a resposta ao i. "Se a Lei for rejeitada, o governo holandês, acima do britânico, já garantiu que não está disponível para mais negociações. E o caso irá para tribunal." Se assim for, as autoridades da Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA, fundada no quadro da CEE, em 1960) ficarão responsáveis pela decisão final - que poderá pender para o lado dos governos desembolsadores, já que, em Maio de 2010, a autoridade de vigilância da EFTA definiu que a Islândia tem o dever de lidar com o esquema de garantias subfinanciadas. Nem todos concordam com essa decisão provisória. "O risco de aceitar o actual acordo Icesave (que expõe o país aos movimentos do mercado e às recuperações de bancos e instituições falidas) é muito mais alto do que levar este caso a tribunal, que é o nosso direito civil", sublinhou ao "The Guardian" Frosti Sigurjónsson, a liderar uma das campanhas pelo "não". O empresário islandês está esperançoso na alteração dos resultados. "Vai ser renhido, mas esperamos que, quando chegar à hora de votar, as pessoas que não querem pagar estejam mais motivadas do que aquelas que estão dispostas a abrir as carteiras. No início, havia muito medo, porque as pessoas sentiam que, apesar de o acordo não ser bom para elas, dizer ''não'' acarretava algum tipo de resultado terrível. Mas já não é esse o caso", garantiu. Ironicamente, foi ontem publicado num jornal britânico um artigo de opinião de uma eurodeputada que pede aos islandeses que votem Não no referendo."

(in "ionline", por Joana Viana)


Estamos perante mais um sujo exemplo das práticas "democráticas" de partidos "social-democratas" europeus da actualidade, isto é, tudo fazem para, em violação da vontade maioritária expressa pelo povo islandês no primeiro referendo, forçarem os eleitores a votarem contra a decisão tomada por estes de não aceitarem pagar as roubalheiras dos banqueiros. Desta vez, saíram de novo derrotados nas suas manobras.

Os islandeses, à sua maneira, estão dando-nos uma grande lição de dignidade e de vontade cívica, uma lição tanto mais importante quanto ela se verifica num pequeno país europeu que, depois de experimentar uma mas mais despudoradas e predatórias políticas de especulação financeira dos banqueiros locais, a mando dos grandes bancos ingleses e holandeses - entre outros mais -, continua sendo um país a viver sob o sistema capitalista.


O mundo capitalista está em acelerada mutação e, como sempre ocorre nestas etapas históricas de grandes mudanças, a par de manifestações das mais criminosas políticas de devastação sócio-económica do globalizado neoliberalismo - políticas, nos dias de hoje, centradas no continente europeu, transformado em sede mundial do neoliberalismo e das máfias neofascistas -, têm também lugar experiências e fenómenos políticos novos de resistência e de luta dos povos agredidos, opondo-se com coragem àquilo que era há alguns meses atrás propagandeado como uma marcha imparável do capitalismo selvático deste início de século.

Na pequena ilha islandesa, um povo continua a rejeitar pagar pelos crimes económico-financeiros dos seus algozes e diz "Não!". E, entretanto, nos países árabes do sul do Mediterrâneo os povos prosseguem com as suas insurreições, desafiando a repressão odiosa dos governos lacaios locais do imperialismo e fazendo alastrar a mais países e regiões limítrofes esse novo clima político de rebeliões e levantamentos populares. Neste caso, desmentindo as "teorizações" derrotistas daqueles que, logo que eclodiram as primeiras revoltas populares na Tunísia e no Egipto, se apressaram a predizer o seu rápido fracasso e esmagamento. A vida aí está a demonstrar como estavam erradas essas avaliações políticas oportunistas.

Os tempos actuais são de viragem, de profunda mudança, evidenciando os limites já muito estreitos do sistema capitalista para continuar a reproduzir-se como até há pouco vinha conseguindo fazer. Na Europa desta UE imperialista - agressiva, militarista, neofascista -, após a Irlanda e a Grécia, Portugal é agora "a bola de vez" da predatória acção de roubo e esbulho dos recursos dos países e povos da sua periferia sul. A não ser contida e derrotada esta vaga da ofensiva de classe do neoliberalismo em decomposição - qual besta moribunda, capaz ainda das maiores barbaridades - serão muito sombrios os dias vindouros que esperam as novas e as velhas gerações.

Tal como voltaram a dizer os islandeses, aos combatentes de vanguarda, aos revolucionários, a todos os patriotas, seguindo o exemplo dos outros povos irmãos - europeus e árabes - em luta, cabe-nos afirmar a única palavra justa e apropriada a esta nossa época, : "Não!". Um corajoso e vigoroso "Não!" a esta UE, não à invasão e ocupação do Estado português pelos agentes imperialistas do FMI, não ao pagamento pelo povo do roubo praticado pelos banqueiros e grandes grupos económicos, não à vergonhosa política de rendição e submissão às ordens do grande capital. Por muito menores crimes e males anti-populares, há muitos anos atrás o povo português soube dar o destino devido ao traidor Miguel de Vasconcelos. É essa gesta patriótica que hoje volta a estar na ordem do dia, pela vontade e luta dos trabalhadores e dos verdadeiros democratas. "Carpe Diem"!


(1)Nota: Contados 90% dos votos, os resultados mostram que o campo do "Não" tem 59,1% e o do "Sim" apenas 40,9%.

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