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sábado, 16 de fevereiro de 2013

A PARTICIPAÇÃO DOS PCs NO GOVERNO: UMA FORMA DE SAIR DA CRISE CAPITALISTA?


 
O tema é de manifesto interesse para todos aqueles que se reclamam comunistas, para quantos se preocupam em analisar a realidade política usando como ferramenta analítica, como instrumento interpretativo indispensável, o marxismo-leninismo.  Vivendo nestes tempos de transformações vertiginosas, de mudanças quantitativas e qualitativas que ocorrem sob uma dura carapaça ideológica assente nos dogmas dominantes da globalização capitalista, escalpelizar a realidade e discernir as suas características multiformes e dialécticas é tarefa "incontornável" de todos nós, de todos os que recusam com firmeza e determinação as ementas traiçoeiras da "incontornabilidade" do sistema capitalista.
 
Recusando o combate e a luta de classes, os partidos europeus reformistas, sejam eles socialistas, de esquerda ou mesmo "comunistas",  carregam a odiosa condição de partidos colaboracionistas com o poder político do capital, vergando-se perante a pressão da ideologia liberal neofascista e aceitando participar na estratégia de dominação capitalista e  de perpetuação da exploração de classe, sob a máscara das falsas mudanças e renovações, auto-justificadas pela estafada frase-feita, martelada por eles até à náusea, papagueando que "o mundo mudou, todos temos que nos adaptar às novas realidades". 
Sempre disponíveis para colaborar nas soluções de poder do sistema capitalista, alinhando ao lado dos partidos do capital a troco de umas migalhas políticas oferecidas pela burguesia oligárquica sempre que esta considera poderem ser-lhe úteis na aplicação dos seus criminosos programas de governo, são afinal seus partidos-muleta, coniventes com as maiores atrocidades sociais e com monstruosos crimes todos os dias friamente cometidos contra os seus próprios povos e países.

Traduzido e editado na página do PCBrasileiro, é seu autor Herwig Lerouge, redator-chefe da publicação Estudos Marxistas, que procede neste importante artigo, recheado de úteis citações e remissões - com interessantes link's nas notas - a uma análise histórica e de crítica política às novas/velhas teorizações do reformismo europeu, a par de uma viva exposição das "teorizações" deste. Um estudo que, pelo seu óbvio interesse, abaixo se transcreve na íntegra.  

A PARTICIPAÇÃO DOS PCs NO GOVERNO: UMA FORMA DE SAIR DA CRISE CAPITALISTA?

 
Ao longo dos últimos anos, a possibilidade existente de certos partidos comunistas (ou ex-comunistas) de participar do governo, permanece na ordem do dia. Na Alemanha, o Die Linke participou de alguns governos regionais e, certamente, continua participando. O partido discute a possibilidade de participar do governo federal. Na Grécia e nos Países Baixos, a coalizão de esquerda Syriza e o Socialistische Partij vem anunciando claramente sua vontade de entrar para o governo. A folgada maioria do Partido Socialista Francês, durante as recentes eleições parlamentares de 2012, eliminou a dúvida sobre uma nova participação no governo do Partido Comunista Francês. O PCF e, na Itália, a Rifondazione Comunista e o Partido dos Comunistas Italianos, participaram de muitos governos no transcorrer das últimas décadas.
Em 2008, o êxito eleitoral de alguns destes partidos levaram uma revista britânica de esquerda, a The New Statesman, concluir: “O socialismo, o socialismo puro, inalterado, uma ideologia considerada morta pelos capitalistas liberais, regressa com força. Ao longo do continente, assistimos à tendência de que os partidos de centro-esquerda estabelecidos há muito tempo sejam desafiados por outros, indubitavelmente socialistas, que defendem um sistema econômico em que os interesses do capital se subordinem aos dos simples trabalhadores”. [1]
Infelizmente, esta visão sobre um brilhante futuro socialista para a Europa foi ultrapassada pelos últimos resultados eleitorais e, fato mais importante ainda, pela evolução política destes partidos.
A tragédia italiana
A maioria destes partidos foi criada depois da contrarrevolução de veludo de Gorbachev. Na Itália, durante seu congresso em Rimini, em 1991, o histórico Partido Comunista Italiano (PCI) se transformou em um partido socialdemocrata ordinário. Nesse mesmo ano, os comunistas italianos fundaram o Partito della Rifondazione Comunista (Partido da Refundação Comunista). No seio do Rifondazione, o debate sobre a estratégia do partido ficou aberto por muito tempo... Quando Bertinotti ascendeu à presidência, o debate se acelerou. Durante o 5º Congresso do Rifondazione, em fevereiro de 2002, Bertinotti apresentou suas 63 teses como uma soma de “inovações”. Descobriu uma “nova classe operária” nascida em Gênova, em 2001, e um “novo conceito de partido”. Rechaçando o partido de vanguarda, que era “obsoleto”, o substituiu por um partido concebido como uma soma de “movimento de movimentos”. Descobriu, igualmente, uma “nova definição de imperialismo”, segundo a qual o mundo já não se dividia em blocos capitalistas rivais e a guerra deixou de ser o meio pelo qual o mundo era partilhado de maneira periódica. “O antigo centralismo democrático foi substituído pelo direito a tendências”. [2]
Depois de 36 meses de inovação, a direção do Rifondazione Comunista se declarou pronta para participar do governo, junto com os democratas cristãos de Romano Prodi e a socialdemocracia de D’Alema. Durante o 6º Congresso do PRC, em março de 2005, Bertinotti afirmou que seu partido devia ser a força motriz de um processo de reforma. E a participação no governo passou a ser um passo necessário na dita direção. No discurso de encerramento do Congresso afirmou: “O governo, inclusive o melhor, não é mais que um passo, um passo de compromisso. O partido deve situar-se em uma posição em que se deixe transparecer sua estratégia, a fim de mostrar que quer ir mais longe […]”. [3] Para prevenir se de críticas contra o PRC, que faz parte de uma coalizão favorável à UE junto ao antigo presidente da Comissão Europeia, Romano Prodi, Bertinotti não encontrou melhor desculpa que a já gasta pirueta da socialdemocracia: “Devemos difundir a ideia de que os movimentos e o partido devem guardar sua autonomia a respeito do governo. O partido não deve ser identificado com o governo. Deve manter sua própria linha e uma estratégia ativa separada deste”. [4]
O conhecidíssimo membro do grupo Bildelberg, Romano Prodi, esteve presente no Congresso e percebeu muito bem a virada do dirigente da Rifondazione: “Há aqui um partido socialista de esquerdas que aceita o desafio de governo”. [5]
Em menos de 10 anos, Bertinotti conseguiu colocar um importante potencial revolucionário sob o controle do sistema. No ano de 2007, o PRC se somou à coalizão do “Olivo”. Sem uma clara oposição de esquerdas anticapitalista à participação na guerra no Afeganistão e às medidas de austeridade do governo de Prodi, a direita chegou ao vazio político e Berlusconi chegou ao poder. O PRC perdeu toda sua representação parlamentar na débâcle da esquerda eleitoral. Trata-se da experiência mais recente dos estragos que o revisionismo pode ocasionar. Atualmente, o movimento comunista italiano atravessa uma profunda crise.
França: Comunistas no governo (1981, 1987)
O século XX já provou o fracasso dos que pretendem modificar o equilíbrio de poder em favor da classe trabalhadora, mediante maiorias no seio do parlamento burguês.
Na euforia da vitória eleitoral de Miterrand, em 1981, o secretário geral do PCF, George Marchais, designou 4 comunistas ao governo com o intuito de modificar “o equilíbrio de poder”. O dirigente do PCF, Roland Leroy, justificou o ato da seguinte maneira: “Nossa presença está relacionada à nossa missão e nossa estratégia: utilizar cada oportunidade, inclusive o menor passo adiante, para construir um socialismo original, mediante meios democráticos”. [6]
No lugar de obter um socialismo original, a classe operária francesa teve de suportar um Código de Trabalho desregulado, uma seguridade social reduzida, além do desequilíbrio dos salários com relação ao aumento da inflação. Seis anos mais tarde, em julho de 1997, a direção do PCF voltou a fazer o mesmo. Três ministros comunistas se aliaram ao governo da “esquerda plural” (PS-PCF-Verdes-MDC), que chegava ao poder depois das grandes lutas de 1995. Resultado? No dito governo houve mais privatizações que na soma das administrações de direita de Juppé e Balladur. Por exemplo, a privatização da Air France foi supervisionada pelo ministro comunista de Transportes, Jean-Claude Gayssot. A Air France, France Télécom, as companhias de seguros GAN e CIC, a Sociedad Marsellesa de Crédito, CNP, Aeroespacial, todas elas foram “abertas ao capital”. A direção do PCF continuava no governo de “Jospin – o guerreiro” quando, em 1999, a França apoiou o bombardeio da Iugoslávia pela OTAN.
Certamente foram feitas concessões às exigências sindicais, porém, como ocorreu em 1936, com o governo da Frente Popular, basicamente foram resultado das grandes lutas que precederam ou acompanharam a vitória eleitoral da esquerda.
Pretender modificar no parlamento o equilíbrio de poder em favor da população trabalhadora é absurdo aos olhos de todos aqueles que observam o circo eleitoral, que veem aos milhares os grupos de pressão e as comissões de especialistas pagos pelos grupos de negócios, cuja finalidade é influir diretamente nas decisões políticas. E para mostrar que maneira “a riqueza exerce seu poder indiretamente, porém com maior eficácia” (retomando as palavras de Engels), o melhor lugar são os Estados Unidos. No ano de 2000, os 429 candidatos com melhor financiamento em suas campanhas ocuparam os 429 primeiros lugares no Congresso estadunidense. Só os lugares do 430 ao 469 foram dados a candidatos com menos “fortuna”. [7]
Se existe uma conclusão de toda a época do neoliberalismo, é esta: a evidência de que a influência dos grupos mais poderosos do capital sobre os Estados-nação, as instituições europeias e as instituições financeiras internacionais nunca estiveram tão abertas e descaradas. As decisões reais são a prerrogativa do executivo há muitas décadas e o Parlamento não é mais que um instrumento para ratificar as decisões já tomadas a nível governamental. Cada vez mais as leis se preparam nos gabinetes ministeriais e, atualmente, nos grupos de pressão das empresas mais importantes. A paz duradoura e o progresso social requerem uma sociedade socialista e uma transformação radical da sociedade. A via parlamentar para o socialismo repousa na ilusão de que o grande capital vai aceitar retroceder e que chegará a ceder, sem mais, o aparato do Estado à classe operária quando esta se tornar suficientemente representada no Parlamento.
Naturalmente, devemos ser conscientes que, atualmente, a maioria da população da Europa vê a ordem social atual como a única possível.
Um processo revolucionário requer flexibilidade tática, adaptação à realidade política, uma adequada avaliação do objetivo de cada batalha, um conhecimento exato das contradições de classe e das correlações de força, assim como grandes alianças.
Nós lutamos por reformas, lutamos para reforçar a força política e organizativa dos trabalhadores. Não dizemos à população: “Resolveremos isto por vocês”, mas dizemos: “Tomem vocês mesmos o destino em suas mãos”. Em cada batalha, os trabalhadores adquirem experiência e nosso dever é introduzir a perspectiva socialista, no longo prazo. Inclusive na luta pelas reformas, o decisivo não são o parlamento e as eleições, mas as lutas. Todos os avanços do movimento operário vêm sendo resultado de um combate organizado, fazendo campanha e criando correlação de força nas ruas.
A esquerda europeia
Nos dias 8 e 9 de maio de 2004, os 2 partidos já mencionados, o PRC e o PCF, tornaram-se fundadores do Partido da Esquerda Europeia. Bertinotti foi nomeado seu presidente.
O Partido da Esquerda é um salto qualitativo da evolução para o reformismo (de esquerdas), declarou um de seus fundadores, o presidente do Partido do Socialismo Democrático (PDS), Lothar Bisky. Em uma entrevista realizada pela revista Freitag, explicou: “Para as forças políticas da União Europeia que têm como origem o movimento operário revolucionário, o Partido da Esquerda Europeia significa um novo passo qualitativo no processo de adaptação do socialismo de esquerdas”. [8]
Nem no Manifesto da Esquerda Europeia e nem em seus estatutos, se faz referência à propriedade privada dos meios de produção, às crises econômicas inerentes ao sistema, à concorrência assassina travada entre as empresas monopolistas ou à partilha do mundo entre as principais potências imperialistas. O partido da Esquerda Europeia promete “uma alternativa progressista”, a “paz”, a “justiça social”, um “desenvolvimento sustentável” e outras maravilhas aos quais ninguém se apresenta contrário. [9]
Tudo se apresenta de forma muito vaga dentro dos limites do sistema e de suas relações de propriedade. É um esforço vão buscar a menor referência à estratégia da revolução social. Ao contrário, o Partido se centra basicamente na “reforma em profundidade” das instituições do sistema. “Queremos fazer com que as instituições eleitas – o Parlamento Europeu e os parlamentos nacionais – tenham mais poder e possibilidades de controle”. [10]
Die Linke
Um partido importante no seio da Esquerda Europeia é o partido alemão da esquerda, Die Linke. Ele é o resultado da unificação, no ano 2007, do Partido do Socialismo Democrático (PDS, o partido que sucedeu o principal partido da RDA, o SED) e o WASG (os socialdemocratas de esquerda desiludidos, dirigentes sindicais e grupos trotskistas da Alemanha Oriental).
O WASG, composto pelo Partido Socialdemocrata (SPD) e os Verdes, nasceu no ano de 2005, depois dos protestos suscitados contra o governo de Gehrard Schröder. A reforma Hartz IV, que acabou com o seguro desemprego no prazo de um ano ao introduzir os desempregados em um sistema de assistência social, criou um enorme setor de salários baixos. As consequências da reforma Hartz IV foram desastrosas. Um informe das Nações Unidas [11] sobre a situação social na Alemanha mostra que, na atualidade, 13% da população vivem abaixo do nível de pobreza e que 1.3 milhões de pessoas, ainda que tenham trabalho, precisam de uma ajuda suplementar, pois seus rendimentos não são suficientes para a subsistência. A pobreza infantil afeta 2.5 milhões de crianças. Alguns estudos mostram que 25% dos estudantes vão para as aulas sem tomar o desjejum.
Assistimos ao aumento da pobreza entre as pessoas idosas devido às aposentadorias modestas que diminuem por conta da redução do salário. Atualmente, existem 8.2 milhões de pessoas com empregos temporários ou “mini-jobs” – com salários de menos de 400 euros por mês. Dos novos empregos, 75% são precários. Tudo isto fortalece os super-ricos. Na Alemanha, em 2010, existiam 924 mil milionários, ou seja, eles aumentaram 7.2% em três anos.
Esta “reforma” dividiu o partido socialdemocrata e levou o antigo ministro socialdemocrata, Lafontaine, a abandonar o partido. Ele foi seguido por federações inteiras do movimento sindical alemão. Estes dissidentes criaram o WASG. O partido unificado WASG-PDS se converteu em “Die Linke” e, em 2009, obteve 11.9% dos votos nas eleições federais, alcançando 78 assentos. Seu número de membros rondava a casa dos 80.000.
Porém, três anos mais tarde, segundo as pesquisas mais recentes, o Die Linke passou a ter problemas em ultrapassar o antidemocrático limite dos 5%, que se aplica a todas as eleições, tanto nacionais como regionais alemães. Em maio de 2012, perdeu seus assentos nos Parlamentos federal e regionais de Schleswig-Holstein (de 6%, os votos passaram a 2.2%) e da Renânia do Norte-Westfalia (de 5.6% a 2.5%). O número de membros diminuiu para menos de 70.000.
A nova socialdemocracia
O Die Linke adotou um programa durante seu congresso em Erfurt, em 2011. Ele se apresenta como uma síntese entre as tendências marxistas e os realistas muito reformistas. [12]
“O Die Linke, como partido socialista, opta por alternativas, por um futuro melhor” (p. 4). Este futuro inclui, com grande justiça, “uma vida com seguridade social, com uma renda mínima assegurada, isenta de impostos e protegida da pobreza, assim como uma proteção total contra a dependência, com uma pensão obrigatória para todos, que se apoie na luta contra a pobreza, com educação de qualidade, gratuita, acessível a todos, com diversidade cultural e participação de todos na riqueza cultural da sociedade, com um sistema de impostos justo, que reduza as cargas impostas às rendas baixas e médias, porém que as aumente às altas rendas, apontando substancialmente às grandes fortunas, para fazer efetiva a democracia e fazer valer a lei contra o poder exorbitante das grandes companhias, com a abolição de toda forma de discriminação baseada no sexo, idade, classe social, filosofia, religião, origem étnica, orientação sexual e identidade, ou baseada nas incapacidades de qualquer gênero”.
Porém, não se sabe ao certo se estas boas intenções se concretizarão neste sistema capitalista ou se é necessário abolir este sistema. Em uma passagem, é possível ler: “Necessitamos de um sistema econômico e social diferente: o socialismo democrático” (p. 4). Critica-se a “’economia social de mercado” como “um compromisso entre o trabalho assalariado e o capital que nunca eliminou a exploração depredadora da natureza e nem as relações patriarcais nas esferas públicas e privadas”. Em outras passagens, o problema não é o sistema, mas sim o “capitalismo sem restrições” (p. 58), o “modelo político neoliberal” (p. 56) e os “mercados financeiros desregulados” (p.15).
O texto evoca um “longo processo de emancipação, no qual o domínio do capital será revertido mediante as forças democráticas, sociais e ecológicas”, que levará a uma “sociedade democrática” (p.5). Em outra parte do documento, a chave da transformação social é a questão da propriedade. “Enquanto as decisões tomadas pelas grandes companhias se orientarem mais pelos benefícios ansiados que para o bem público, a política estará sujeita a chantagens e se minará a democracia”.
Mais adiante, “a propriedade pública” se limita “aos serviços de interesse geral de infraestrutura social, às indústrias do setor energético e ao setor financeiro” (p.5). E o programa copia a velha tese socialdemocrata “da democracia que se estende à tomada de decisões econômicas e submete todas as formas de propriedade a normas emancipacionistas, sociais e ideológicas. Sem democracia na economia, a democracia permanece imperfeita […]”. De modo que esta “ordem econômica democrática diferente” será uma economia de mercado regulada. “Submeteremos a regulação do mercado da produção e da distribuição a um marco e a um controle democrático, social e ecológico”. “O mundo dos negócios deve estar submetido a um severo controle da concorrência” (p.5).
A classe operária não tem nenhum papel na conquista do poder político. É questão de “maiorias vencedoras” (p.20) e o “socialismo democrático” poderá ser levado a cabo no seio das estruturas “democráticas” da constituição alemã e de um “estado social de direito”.
Os serviços de inteligência deverão ser abolidos, porém o “controle democrático” do exército e da polícia será suficiente para transformá-los em ferramentas do socialismo.
A participação no governo
Segundo o programa, a participação no governo só tem sentido se baseada no “repúdio ao modelo político neoliberal”, se supõe uma mudança “social e ecológica” e a possibilidade de melhorar o nível de vida da população. No caso, “o poder político do Die Linke e dos movimentos sociais poderão ser reforçados” e “o sentimento de impotência política que existe entre um sem número de pessoas poderá ser eliminado” (p.56).
A pergunta feita é: como é possível adotar esta posição pouco depois da queda daquilo que sempre tinha sido apresentado como um notável exemplo da estratégia do partido: o desastre de Berlim? Em agosto de 2010, Die Linke se fundiu nas eleições do Senado de Berlim. Em 10 anos de participação no governo berlinense, o partido sofreu uma débâcle, passando de 22.3% a 11.5%.
Durante 10 longos anos, a coalizão governamental SPD-Die Linke governou a capital alemã. Foram fechadas inúmeras creches, cortadas indenizações sociais e privatizadas 122.000 habitações sociais. O Die Linke votou pela privatização parcial do sistema berlinense de eletricidade, fez campanha contra a paridade nacional de salários dos trabalhadores do setor público (que, todavia, ganham consideravelmente menos no Ocidente) e se manifestou contra os esforços de devolver à titularidade pública a Sociedade de Água de Berlim. Contribuiu, igualmente, para privatizar uma parte do principal hospital de Berlim – o que se traduziria em uma degradação das condições de trabalho e uma diminuição dos salários.
Mathias Behnis, cientista político e porta-voz da frente de resistência contra a privatização da sociedade berlinense de distribuição de água, e Benedict Ugarte Chacón, cientista político e porta-voz da iniciativa berlinense contra o escândalo bancário, publicaram um balanço particularmente preocupante no jornal Junge Welt, de 20 de agosto de 2011. [13] A coalizão SPD-PDS (até então, tratava-se do PDS que, mais tarde, participaria da criação do Die Linke) expôs claramente, desde o início de 2002, qual caminho percorreria ao aprovar um fundo de risco para a Bankgesellschaft Berlín. Ela assumiu os riscos de um fundo imobiliário criado por bancos no valor 21.6 bilhões de euros. Desde então, Berlim administra as perdas anuais destes bancos. O PDS esteve de acordo em garantir os lucros dos acionistas destes fundos, com ajuda do dinheiro público.
Ao mesmo tempo, dirigiu uma política monetária estrita em detrimento, por exemplo, dos subsídios aos cegos, em 2003, ou dos bilhetes sociais para o transporte público urbano, em 2004, depois que os governos federais suprimiram os subsídios. Foram necessários enormes protestos sociais para reintroduzir estes bilhetes, porém a um custo muito mais elevado.
As creches e as universidades deixaram de se subvencionarem. Isto detonou veementes protestos entre os estudantes e o congresso do PDS, ocorrido em 6 de dezembro de 2003, no luxuoso hotel Maritim, no centro de Berlim, teve que ser protegido pela polícia de choque, que forçou a evacuação das ruas com brutalidade.
Em maio de 2003, os pais foram obrigados a gastar até 100 euros com a compra de livros escolares.
O Die Linke, em Berlim, é igualmente responsável pela piora na situação de milhares de inquilinos. Em maio de 2004, o governo regional berlinense vendeu 65.700 casas da sociedade pública de alojamento GSW ao vantajoso preço de 405 milhões de euros a um consórcio ao qual o Whitehall-Fund, do banco de investimentos Goldman Sachs e da sociedade de investimentos Cerberus. Em 2010, permitiu que estas sociedades entrassem na Bolsa de Valores e transformassem milhares de alojamentos berlinenses em objetos de especulação.
Da mesma forma, aboliu os subsídios dos proprietários que disponibilizavam suas casas ao aluguel social, sem se preocupar com o que aconteceria aos inquilinos. Nos antigos apartamentos, até então muito baratos, ocupados, sobretudo, por trabalhadores com baixos salários e por desempregados, os aluguéis aumentaram em 17%.
A água que se tornou mercadoria
Em 1999, o antigo governo vendeu 49.9% da antiga sociedade de distribuição de água berlinense para a RWE e a Vivendo (Veolia). O PDS obteve o posto de ministro da Economia em 2002, porém não fez nenhuma mudança. O preço da água aumentou, aproximadamente, 33%. Durante o antigo governo, o PDS fez campanha contra a privatização parcial da água. Porém, o ministro do PDS, Wolf, fez exatamente aquilo que era contra: garantiu os benefícios dos acionistas privados e beneficiou-se com os elevados preços da água.
No acordo de coalizão de 2006, Die Linke e o SPD falaram de comprometerem-se com o retorno da sociedade de distribuição de água à autoridade municipal. Porém, não se fez nada. Pior ainda, opuseram-se, de todas as maneiras, ao grande movimento extraparlamentar em favor da publicação do acordo secreto de privatização da sociedade de distribuição de água. Mais de 666.000 pessoas exigiram que fosse objeto de um referendo. A coalizão fez campanha contra esta ação. Aceitaram o referendo, obtido forçosamente, porém continuaram opondo-se a toda iniciativa legal da população.
Tudo o que podem dizer em sua defesa, é a eterna cantilena dos socialdemocratas: “Sem nós, teria sido pior”. Porém, não. Teria sido bastante parecido ou, talvez, melhor, pois com sua participação paralisaram uma parte do potencial de resistência.
Depois de sofrer um golpe nas eleições, queixaram-se de não terem conseguido impor seus pontos de vista ao SPD. Havia “restrições à liberdade do movimento”, disse o dirigente do partido, Klaus Lederer. Naturalmente. Porém, quando existe a promessa de participar de um governo para mudar as coisas, não é surpresa se, no fim das contas, as pessoas perguntam o que foi modificado.
Nos governos regionais de Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental, de Brandeburgo e de Berlim, o partido participou das restrições e dos fechamentos.
Certamente, o Congresso de Erfurt concluiu que a participação no governo tem sentido.
A participação em governos locais e, inclusive, federais, apenas se discute no seio do partido. A ala direita da direção aproveita, inclusive, os maus resultados recentes para reclamar que o partido renuncie a seu “desejo de permanecer na oposição”. Deve declarar abertamente sua intenção de participar em todos os níveis de governo, particularmente com seu “companheiro natural de coalizão”, o SPD. Dietmar Bartsch, um de seus principais porta-vozes, é apoiado pelo partido do Länder do leste, onde a organização é mais numerosa. No Leste, a participação no governo se tornou norma.
Oskar Lafontaine, considerado como representante da esquerda do partido, nunca se opôs a que o partido embarque nas coalizões do poder – ao contrário. É keynesiano e sonha com um tipo de Estado de bem-estar socialmente limitado a nível nacional. O regresso aos anos 70. Junto com seus companheiros, não deixa de formular os “princípios” ou “condições” que justifiquem a participação no governo.
“Não podemos deixar o SPD e os Verdes governarem sozinhos. O social só é possível com a nossa participação”. Esse era o título do texto de base da direção do partido durante seu congresso em Rostock, no ano de 2010. “O Die Linke pode governar, inclusive melhor que os demais. E nós, em Mecklenburgo-Pomerânia Ocidental temos ideias muito claras sobre o que deve melhorar e como fazê-lo”, declara Steffen Bockhahn, presidente regional do Die Linke no Land Mecklenburgo-Pomerânia Ocidental [14]. “Devemos ter alternativas à coalizão CDU-FDP”, dizem os dirigentes do partido. Como se o SPD e os Verdes não estivessem de acordo em fazer os trabalhadores pagarem os prejuízos causados pela crise! Já não há crítica radical para estes partidos.
O Die Linke afirma que combina os protestos sociais e políticos, elaborando possíveis alternativas e transformações políticas no marco do governo. Porém, é evidente que, atualmente, não existem as correlações de força que tornem possível o exercício de tal pressão sobre os governos, que se veem forçados a realizarem reformas importantes a favor do povo. A única consequência da participação governamental é que paralisa os movimentos de massas e os integra ao sistema, como já visto em Berlim.
As experiências da participação comunista nos governos europeus comprovam que esta participação não detém as privatizações, a regressão social e nem as guerras imperialistas. Estas experiências estremeceram a confiança nos partidos que participam desses governos e mostram que não há diferença com outros partidos. A participação de um governo burguês, onde os monopólios capitalistas dominam, debilita as forças anticapitalistas.
Na Grécia
No entanto, alguns partidos repudiam aprender as lições das ditas experiências. Provam que se tornaram autênticos partidos socialdemocratas, prontos para substituir os antigos, hoje desacreditados, partidos.
Na Grécia, quanto maiores as possibilidade existentes de uma vitória eleitoral, mais aceitável seu programa se torna, assim como a seção local do Partido da Esquerda Europeia, o Syriza, para a direção da UE e para a burguesia grega. Seu programa governamental [15] se apresentou como um “plano para colocar fim à crise”. “O propósito é unir o povo ao redor do programa governamental do Syriza com a finalidade de libertar a Grécia da crise, da pobreza e sua má reputação”. Não se menciona em nenhum site o sistema capitalista como o causador da crise: tão somente é mais o resultado da gestão “neoliberal”. O programa se apresenta como social e fiscalmente equitativo, prometendo anular as medidas mais insuportáveis e antissociais, aumentar o salário mínimo, restaurar o antigo nível de proteção contra o desemprego e enfermidade. Também promete suprimir os impostos especiais àqueles que possuem baixa ou média renda. Porém, este plano só pretende a “estabilização dos gastos básicos em torno de 43% do PIB, frente aos 36% do relatório e a um máximo de 46% do PIB”. A ideia é colocar a Grécia “no centro atual do seio da zona do euro”. É um programa que não vai mais além do marco capitalista. “Organizaremos a revitalização da produção do país com importantes investimentos para apoiar o desenvolvimento de indústrias competitivas”. Também promete congelar a privatização apenas de entidades públicas de importância estratégia que ainda eram públicas em 2010, quando estourou a crise. Sobre a dívida, o programa busca um compromisso com a burguesia da UE. Está muito abaixo do programa de 10 pontos do Syriza das eleições de 6 de maio, que exigia “uma moratória do pagamento da dívida, negociações para anular certas dívidas (não a dívida, como exige o KKE) e a regulação da dívida restante para incluir provisões para o desenvolvimento econômico e o emprego” [16]. Em 8 de maio, depois das primeiras eleições, Alexis Tsipras, o dirigente do Syriza, apresentou um programa de cinco pontos como base para a formação de um “governo de esquerdas”. Agora, só pleiteia “a criação de uma comissão de auditoria internacional para investigar as causas do déficit na Grécia, com uma moratória do pagamento da dívida em espera da publicação dos resultados da auditoria” [17].
Antes das novas eleições de 17 de junho, seu “programa de governo” se limita a denunciar os empréstimos (negociados com a Troika) substituindo suas condições por “outras que não ponham em dúvida a soberania nacional da Grécia e a sobrevivência econômica de nosso país. Não se aceitarão sem mais condições como a prioridade no reembolso de empréstimos ou a apreensão dos bens de propriedade do Estado, como acordada com os credores no relatório…”. Não há reivindicações radicais que busquem fazer pagar os responsáveis da crise (os burgueses gregos e europeus e outros bancos...), nem meios para impor suas medidas. Tudo será negociado. O programa não espera impor “a anulação do regime de imposto zero para as companhias de transporte e para a Igreja”, mas “busca um acordo” com a indústria marítima para abolir as 58 isenções. Não se diz nada sobre a criação de um governo capaz de impor suas próprias medidas. Quer “elevar o nível de impostos ao mesmo nível que o resto da UE”, onde a totalidade da carga recai nas costas da população trabalhadora. Em nenhuma parte se discute a questão do controle da administração ou do sistema econômico pelos trabalhadores. Quem vai controlar os patrões, os banqueiros? Nada se aborda sobre a polícia, o exército. O Syriza permanece no seio da OTAN, da UE.
As duras lições do passado
As experiências confirmam as posições de Marx, Lênin e a Terceira Internacional sobre este assunto. Elas repudiam toda a participação, à exceção de situações nas quais o fascismo constitua uma ameaça real, no caso de uma situação que possam dar lugar a uma transição para um governo realmente revolucionário, isto é, em situações pré-revolucionárias importantes com lutas de classe e correlação de forças favorável (como no Chile, no início dos anos 70, e em Portugal, em 1975...). Nestas situações, é possível que devamos selar alianças com forças que representem camadas não proletárias, porém que são igualmente oprimidas pelos monopólios ou ameaçadas pelo fascismo ou inimigos exteriores. Porém, só sob a condição de que este poder evolua ou deseje evoluir para a democracia popular e para o socialismo, para um Estado diferente controlado pelos trabalhadores. Não foi o caso do Chile, onde a reação massacrou socialistas e comunistas, metendo-os no mesmo saco.
O governo dos trabalhadores, tal e como foi proposto pela Terceira Internacional, se entende como “a frente unida de todos os trabalhadores e uma coalizão de todos os partidos de trabalhadores, tanto na área econômica como política, para lutar contra o poder da burguesia e, finalmente, para derrubá-la”. “As tarefas mais fundamentais de tal governo de trabalhadores devem consistir em armar os trabalhadores, desarmar as organizações contrarrevolucionárias burguesas, introduzir o controle da produção (pelos trabalhadores), fazer carregar o principal peso dos impostos sobre os ricos e romper a resistência da burguesia contrarrevolucionária” [18].
O dito governo dos trabalhadores só é possível se nasce das lutas de massas e se é apoiado pelas organizações militantes dos trabalhadores. [19]
Aqueles que justificam uma coalizão com os partidos políticos burgueses nas instituições parlamentares, utilizam parte dos escritos de Dimitrov sobre a frente unida contra o fascismo. É certo que Dimitrov criticava as pessoas que rechaçavam a política da frente unida contra o fascismo, porém segundo Dimitrov, a frente popular antifascista deve ser criada tendo como base uma frente unida de trabalhadores. Pede que um governo de frente popular tome medidas revolucionárias anticapitalistas: pode surgir “uma situação tal que a formação de um governo de frente única proletária ou de frente obedeça aos interesses do proletário. […] Exigimos deste que ponha em prática as reivindicações revolucionárias radicais, determinadas, que respondam à situação. Por exemplo, o controle da produção, o controle dos bancos, a dissolução da polícia, sua substituição pela milícia operária armada, etc”. [20]
Dimitrov alertou contra o fato de que, “manter uma frente popular na França não significa que a classe operária vá apoiar o atual governo [21] a todo custo [...]. Se, por uma razão ou outra, o governo existente se mostra incapaz de fazer valer o programa da Frente Popular, adota uma linha de retirada ante o inimigo, de seu país e do estrangeiro. Se uma política debilita a resistência à ofensiva fascista, então, a classe operária, com o propósito de reassegurar os laços da Frente Popular, provocará a substituição do atual governo por outro”. [22]
É o que aconteceu e o PCF demorou muito tempo para compreender. Em 1936, depois da vitória eleitoral dos partidos de esquerda, se formou o governo Blum de socialistas e radicais, apoiado externamente pelo PCF. Uma enorme onda de greves exerceu pressão sobre o governo para forçá-lo a satisfazer as reivindicações que se encontravam no programa da Frente Popular. Porém, para retomar os termos de seu presidente, o governo se fixou como objetivo encontrar uma maneira de “procurar um alívio suficiente para aqueles que sofrem” no marco da sociedade de então. Para Blum, a missão da Frente Popular consistia em “moderar a sociedade burguesa” e remover “um máximo de ordem, bem-estar, segurança e justiça”. Nessas condições, o impacto negativo da participação no governo aumentou consideravelmente. Historicamente, as administrações “de esquerda” presidindo sistemas capitalistas desmoralizaram e desmobilizaram a classe operária, além de abrirem caminho para partidos e governos conservadores e, inclusive, de extrema direita.
O governo de Blum foi derrubado dois anos depois e bastaram dois anos a mais para que os capitalistas franceses quisessem revanche e recuperassem as concessões que haviam feito. Por iniciativa do Partido Socialista, o governo dirigido pelo líder do Partido Radical, Daladier, ilegalizou o PC em 21 de novembro de 1939 e seus representantes foram submetidos a julgamento. Em 7 de julho de 1940, os mesmos representantes radicais e socialistas deram seu voto de confiança ao governo do traidor Pétain.
Inclusive nos períodos em que a participação no governo pode levar à fase de luta aberta pelo socialismo, é necessária uma extrema vigilância.
Em setembro de 1947, durante uma reunião onde estavam presentes membros do novo órgão de coordenação dos partidos comunistas depois da Segunda Guerra Mundial – o Kominform [23] – os participantes criticaram a linha oportunista do PCF em sua política de frente unida durante a ocupação e sua participação no subsequente governo.
A burguesia tinha interesse em cooperar com os comunistas durante e depois da guerra porque era débil. Os comunistas deveriam ter aproveitado essa situação para ocupar postos-chave, porém não o fizeram. No lugar de conquistar o apoio das massas para tomar o poder, desarmaram as massas e semearam ilusões sobre a democracia burguesa e o parlamentarismo.
No lugar de criar a unidade antifascista a partir da base, mediante a criação de instrumentos emanados das massas, juntando todas as tendências que estavam realmente dispostas a seguir a via da luta por um poder revolucionário, os dirigentes do PCF e do PCI cometeram o erro de construir uma frente por cima, tendo como base uma representação igualitária dos diferentes partidos, quando o objetivo dos partidos burgueses era evitar a transformação real do país. Para colocar em prática esta política, os dirigentes do PCF e do PCI argumentaram que toda reivindicação diferente à de libertação nacional, toda reivindicação diferente à de mudanças democráticas radicais e revolucionárias, afastaria da frente antifascista um número expressivo de grupos sociais e de forças políticas.
A reunião criticou o PCF por ter permitido e até facilitado o desarmamento e a dissolução das forças da Resistência sob o pretexto de que a guerra tinha terminado e que uma ação contra a política de De Gaulle desembocaria em um confronto com os Aliados. Esta concepção facilitou a tarefa dos imperialistas preocupados em reconquistar suas posições anteriores à guerra. Criou ilusões sobre a “democracia” dos imperialistas e sua capacidade de ajudar na reconstrução, sem outros objetivos, das nações que foram libertadas do fascismo.
Em geral, os delegados da Conferência reprovaram a persistência nas ilusões de uma via parlamentarista para o socialismo, na propagação das mesmas entre as massas no lugar de mobilizá-las contra a política pró-estadunidense de seus governos e por uma alternativa verdadeiramente revolucionária. [24]
Agora menos que nunca
A primeira pergunta persiste: qual é o caráter da sociedade na qual um partido comunista queira participar do governo? É um Estado capitalista. Sua base econômica é o capitalismo e sua tarefa é, obviamente, administrar o capitalismo, proteger e criar condições favoráveis ao sucesso de seu desenvolvimento. Este Estado adota uma constituição, leis e regulamentações que possuem como objetivo garantir a ordem constitucional, criar as condições para o desenvolvimento do capital e evitar conflitos no seio da sociedade.
A política hostil com os trabalhadores nestes Estados não revela políticos malvados e nem os maus partidos, com programas maliciosos. Enquanto a propriedade privada dos meios de produção reinar, enquanto as empresas devem competir para sobreviver, deverão acumular, aumentar seus lucros, reduzir os salários, repudiar as reivindicações sociais. A esta lei não se podem opor “bons” políticos no governo com ideias e programas “corretos”.
O capitalismo atual já não pode, como esperava Lafontaine, voltar à época da chamada “economia social de mercado” com cooperação social. Foi um episódio que deve ser situado no contexto da rivalidade ideológica entre socialismo e capitalismo, da força dos partidos comunistas após a Resistência, quando podiam atender às reivindicações a partir dos lucros da faze da reconstrução do pós-guerra.
Isto já não é possível e nem obviamente necessário na lógica capitalista. Os 25 milhões de desempregados oficiais da UE, que exercem uma pressão sobre os salários e os mercados de trabalho, hoje mundialmente acessíveis, reduzem o preço da mão de obra. O custo do desemprego duplica o orçamento social: os salários em baixa proporcionam menos renda aos fundos de seguridade social e, cada vez mais, existem beneficiários para serem atendidos por esses fundos.
O colapso do sistema de seguridade social não é mais que uma questão de tempo se não há um combate de envergadura para fazer com que o capital pague impostos. Além disso, as rendas dos impostos sobre os lucros das empresas vão em baixa, apesar de que os lucros crescem: se necessitam reduções suplementares aos impostos para reforçar os capitais nacionais nos mercados internacionais.
O Estado capitalista trabalha para criar as condições favoráveis para o crescimento da rentabilidade das empresas, para criar novos mercados graças à privatização e à redistribuição do rendimento nacional em favor dos possuidores de capital. Está aí para fazer calar ou reprimir a classe operária nacional e para garantir os interesses do capital em outras regiões.
De modo que a participação em governo nestas condições significa unicamente a participação na regressão social, inclusive ainda que alcançada lentamente. Significa desarmar a resistência e dar falsas esperanças ao movimento operário.
Antigos partidos comunistas escolheram participar do poder, sabendo, com certeza, que isto significa governar sob os interesses do capital e participar da destruição das conquistas sociais obtidas após as lutas do movimento operário.
A participação no governo contribuiu para desmobilizar a resistência tão necessária e o desenvolvimento de um contrapoder. Atualmente, para modificar o equilíbrio das forças de classe, devemos nos unir em numerosos combates defensivos contra a regressão social, com a finalidade de criar um movimento político independente de trabalhadores e daqueles a quem se impede trabalhar e difundir uma consciência anticapitalista no seio do movimento operário.
A debilidade dos comunistas e dos sindicatos com uma clara orientação anticapitalista é a principal causa do domínio agressivo do capital na maior parte dos países capitalistas.
Necessitamos um programa político alternativo e devemos lutar por ele. Que inclua reivindicações imediatas, porém que também possua a palavra de ordem da abolição das relações capitalistas de propriedade. Estas reivindicações não deve se dirigir a potenciais sócios no seio de um governo de esquerdas (que não existe), mas a um movimento operário organizado e a outras camadas exploradas da sociedade. Devem dirigir-se aos sindicatos, a todo tipo de organizações populares ativas em todos os domínios da luta social, democrática, anti-imperialista e cultural.
A verdadeira pergunta é saber de que maneira os partidos comunistas vão se preparar para as batalhas que virão, como vão se organizar para ser capazes de assumir eficazmente a carga das novas lutas da classe operária e da população trabalhadora no sentido amplo. A crise leva grandes massas de trabalhadores a dar as costas à socialdemocracia. Não devemos oferecer-lhes uma sociedade socialdemocrata renovada. É necessário um partido revolucionário que tenha em conta o nível de consciência atual, que faça seus os problemas do povo, que fale uma linguagem acessível, que busque a unidade do maior número possível de pessoas na luta. Porém, que não esqueça seus princípios, que mantenha o rumo para uma sociedade na qual não exista exploração do homem pelo homem, uma sociedade sem propriedade privada dos meios de produção, uma sociedade em que os trabalhadores sejam realmente livres e com um Estado que proteja a liberdade da vasta maioria contra a opressão de uma minoria.
Herwig Lerouge é redator-chefe da Estudos Marxistas, www.marx.be
[1] « Socialism’s comeback », New Statesman, diciembre 2008,
http://www.newstatesman.com/europe/2008/12/socialist-partysocialism?page=5.
[2] Fausto Bertinotti e.a., Tesi maggioranza (tese da maioria), V Congresso Nazionale, 2002, Partito della Rifondazione Comunista. Todas as citações sobre o PRCI provém da obra “La clase obrera en la era de las multinacionales“ “A classe operária na era das multinacionais”), de Peter Mertens: http://www.jaimelago.org/node/7. (As teses em italiano : http://www.d-meeus.be/marxisme/modernes/Bertinotti63Tesi.html).
[3] Partito della Rifondazione Communista. VI Congresso Nazionale. Relazione introduttiva del segretario Fausto Bertinotti.
[4] Partito della Rifondazione Comunista. VI Congresso Nazionale. Conclusioni del segretario Fausto Bertinotti.
[5] La Stampa, 4 de março de 2005, p. 7, http://www.archiviolastampa.it/.
[6] Le Nouvel Observateur, 10 de fevereiro de 1984.
[7] Michael Scherer, Amy Paris e.a., « Campaign inflation », en The Mother Jones 400, março 2001,
http://www.motherjones.com/news/special_reports/mojo_400/index.html.
[8] Junge Welt, 8 de abril de 2004, http://www.jungewelt.de/2004/04-08/004.php.
[9] Parti de la Gauche européenne, « Manifeste du Parti de la Gauche européenne », 10 de maio de 2004.
[10] Ibidem.
[11] United Nations Economic and Social Council, 20 de Maio de 2011.Concluding Observations of the Committee on Economic, Social and Cultural Rights. Alemanha,
http://www.agfriedensforschung.de/themen/Menschenrechte/deutsch-un.pdf
[12] Programme of the Die Linke Party
http://en.dielinke.de/fileadmin/download/english_pages/programme_of_the_die_linke_party_2011/programme_of_the_die_linke_party_2011.pdf.
[13] Mathias Behnis et Benedict Ugarte Chacón “Die Überflüssigen: Hintergrund. Harmlos, farblos und immer treu zur SPD. Zehn Jahre
Regierungsbeteiligung der Linkspartei in Berlin — eine unvollständige Bilanz des Scheiterns”, https://www.jungewelt.de/loginFailed.php?ref=/2011/08-20/024.php.
[14] Disput, junho de 2010.
[15] http://transform-network.net/de/blog/blog-2012/news/detail/Blog/a-roadmap-for-the-new-greece.html
[16] http://hellenicantidote.blogspot.be/2012/05/oh-my-god-syrizas-10-pointplan-to-save.html
[17]http://www.ekathimerini.com/4dcgi/_w_articles_wsite1_1_08/05/2012_441181
[18] http://www.contre-informations.fr/komintern/komintern/5.html#A point XI
[19] http://www.marxists.org/francais/inter_com/1922/ic4_01.htm
[20] Georgi Dimitrov, L’Offensive du fascisme et les tâches de l’Internationale communiste dans la lutte pour l’unité de la classe ouvrière contre le fascisme,http://actionantifasciste.fr/documents/analyses/28.html
[21] O governo da Frente popular de socialistas e radicais dirigido por Léon Blum, ver mais adiante.
[22] Georgi Dimitrov, OEuvres choisies, t. 2, p. 160, Sofia Presse
[23] Em 1943, foi desfeita a Terceira Internacional. Após a derrota do fascismo, foi restaurada sob o nome de Kominform. Esta se reuniu somente três vezes. Durante suas sessões, que ocorreram de 23 a 26 de setembro de 1947, se discutiu detalhadamente a situação na França e na Itália.
[24] Intervenção de Djilas de 25 de setembro de 1947. Giuliano Procacci (red.), The Cominform: Minutes of the Three Conferences 1947/1948/1949, Milan, Fondazione Giangiacomo Feltrinelli & Russian Centre of Conservation and Study of Records for Modern History (RTsKhIDNI), 1994, pp 255-257. Citado en Peter Mertens, « La clase obrera en la era de las multinacionales » :http://www.jaimelago.org/node/7 .
 
(Fonte: http://pcb.org.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=5498:a-participacao-dos-pcs-no-governo-uma-forma-de-sair-da-crise-capitalista&catid=93:organizacoes)

Editado antes pelo amigo  Blog do Dario
 

2 comentários:

José Gonçalves Cravinho disse...

O Egoísmo,o Individualismo,
a Vaidade,a Pulhice,a Corrupção são ilimitadas e o Dinheiro corrompe as consciências e destrói os mais belos Ideais.Mas,porém,todavia,contudo.....Com populismo e demagogia,
muita mentira,verdade parece,
mas em liberdade e democracia,
cada Povo tem o Governo que merece.

filipe disse...

Não, amigo José Gonçalves. Frequentemente, nestes regimes políticos de "democracia" burguesa, os povos têm governos que não merecem.
Ilibar o vigarista criticando a ingenuidade do roubado, não é o caminho certo para nós.
Talvez ajude mais se nos questionarmos sobre o que andamos nós próprios a fazer - e procurarmos fazer mais (e melhor?) aquilo que a nós nos cabe.