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quinta-feira, 18 de junho de 2009

A incontestável actualidade do pensamento de Álvaro Cunhal


"O objectivo da construção de uma sociedade socialista de forma alguma impede, antes implica, que um partido comunista tenha soluções e objectivos a curto e médio prazo que proponha como alternativa à situação existente. Atenção, porém. Uma análise da situação e a definição de uma política têm de partir de realidades básicas do capitalismo, a que correspondem conceitos fundamentais da teoria revolucionária do proletariado:
— a divisão da sociedade em classes, umas que exploram, outras que são exploradas;
— a luta de classes;
— a política de classe dos governos.
Trata-se de realidades e de conceitos. A sua descoberta não se deve a Marx e Engels mas a economistas e filósofos anteriores. O que é novo no marxismo é a análise das situações económicas e políticas concretas tendo na base esses conceitos. É certo que, em situações pré revolucionárias e noutras em que se criou um temporário equilíbrio das forças de classe, o poder político, fortemente condicionado, pode conjunturalmente não conduzir uma política ao serviço do capital. Pode mesmo realizar medidas progressistas de carácter anti-capitalista. São porém situações excepcionais e de pouca duração.


Não é o caso de países capitalistas de democracia burguesa. Nesses, o poder político falseia as quatro vertentes da democracia. A económica – pela propriedade dos sectores básicos da economia pelo grande capital e a submissão do poder político ao poder económico. A social – pela exploração e a miséria dos trabalhadores e das massas populares e a concentração da riqueza num número limitado de gigantescas fortunas. A cultural – pela propaganda da ideologia do grande capital, por um sistema de ensino discriminatório para os filhos das classes trabalhadoras, pela propaganda de ideias obscurantistas, pelos atentados à criatividade artística, pela multiplicação de seitas religiosas. A política – pelo abuso e absolutização do poder e a liquidação dos órgãos e mecanismos de fiscalização democrática do seu exercício, pela alteração inconstitucional da legalidade e das competências dos órgãos de soberania quando as leis em vigor se revelam insuficientes para o exercício absoluto do poder do grande capital.


E toda esta degradação se desenvolve com os pretextos da necessária “estabilidade” e do “Estado de direito”. A degradação da democracia política – trazendo consigo os espectaculares e teatrais conflitos de chicana parlamentar, o carreirismo, a impunidade e a corrupção – provoca o descrédito da política e dos políticos. Entretanto, a política é uma actividade necessária e os comunistas e outros verdadeiros democratas são diferentes e melhores na prática política e distinguem-se da chamada “classe política” desacreditada. Os poderosos meios de comunicação social (jornais, revistas, rádios, televisão, audiovisuais), propriedade e instrumento de grandes grupos monopolistas, não constituem um novo poder independente, como alguns pretendem, mas um instrumento do grande capital na sua ligação dominante com os governos.


Sendo a luta pela democracia um dos objectivos centrais da acção de um partido comunista, é indispensável definir quais são os elementos fundamentais dessa democracia. De um governo é de exigir a simultaneidade e complementaridade das suas vertentes fundamentais. Não basta que um governo se afirme democrático. É necessário que de facto o seja. É, ao mesmo tempo, necessário definir-se mais concretamente, em cada situação concreta, a democracia pela qual se luta. Numa situação dada, num momento dado, pode, por exemplo, a luta pela democracia dar grande relevo à luta pelo reforço dos elementos de democracia directa e participativa a par da democracia representativa. As eleições são um dos elementos-base de um regime democrático, mas só assim podem ser consideradas se respeitam a igualdade e se são impedidos os abuso do poder, as discriminações e exclusões. Se estas condições não são conseguidas, as eleições tornam-se uma fraude, um grave atentado à democracia e um instrumento da monopolização do poder, por vezes em alternância, pelas forças políticas ao serviço do capital."


(In "As seis características fundamentais de um Partido Comunista", 2001)

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